terça-feira, 3 de maio de 2011

Clima de Guerra ou a Guerra do Clima

The Catastrophe SnailImage by dklegman via Flickr

António Campos


Uma sucessão crescente de catástrofes “naturais”.

2010, foi mais um ano de catástrofes ambientais suspeitas. Por todo o mundo se bateram recordes de inundações, sismos, fogos, secas, mortos, feridos e desalojados.
Se estes acontecimentos foram surpreendentes pela sua quantidade e amplitude, eles inscrevem-se porém numa série incomum de fenómenos geo-climáticos semelhantes, que se foram multiplicando ao longo dos últimos anos, um pouco por todo o mundo, a uma cadência e com uma magnitude crescente de ano para ano. [1]
Especialistas, técnicos ou simples cidadãos, interrogam-se sobre as razões destes acontecimentos. Serão consequências das tão propagandeadas e pouco debatidas alterações climáticas? Serão fruto da negligência e da ganância sem limites? Ou será ainda algo mais grave?
O ano de 2010 veio, de certo modo, dar resposta a muitas destas interrogações; veio reforçar as opiniões anteriores de muitos especialistas acerca da responsabilidade humana na maioria das catástrofes ditas naturais; veio revelar facetas da intervenção humana até agora pouco conhecidas; veio confirmar que muitos desses desastres até proporcionam lucros fabulosos; veio levantar a suspeita de que por esse motivo, e de acordo com a lógica do mercado, alguns possam ter sido provocadas propositadamente para obtenção de lucro [2]; e veio finalmente revelar que esse procedimento já estava a ser levado às últimas consequências com um objectivo mais vasto e perverso: a sua utilização como arma de guerra.

As cheias na Madeira: um exemplo de “catástrofe natural”.

O caso mais grave ocorrido em território português deu-se no inicio do ano na Ilha da Madeira. Uma conjugação pouco habitual de chuvas intensas num curto intervalo de tempo, provocou o transbordo das águas das ribeiras e o arrastamento de toda a espécie de detritos, não só os naturais - rochas, lama, árvores, etc., mas também, e principalmente, os construídos - estradas, pontes, casas, veículos, para além de animais e pessoas. Segundo os últimos balanços terá havido pelo menos 42 mortos e vários milhões de euros de prejuízos. Ainda de acordo com algumas informações, os prejuízos materiais e humanos serão muito superiores a anteriores situações semelhantes.
Situada em pleno Atlântico, a ilha da Madeira é uma das duas únicas regiões autónomas de Portugal. Vive essencialmente do turismo e do dinheiro dos contribuintes do Continente. É um paraíso fiscal. A sua orografia mostra um pico e encostas íngremes em todos os quadrantes, pelas quais descem inúmeros cursos de água: as ribeiras. A sobreocupação destas encostas com construções é um facto conhecido.
Corre na internet um pequeno documentário apresentado há 2 anos na TV, em que vários técnicos alertavam para o perigo das construções que continuavam a erguer-se na ilha em leitos de cheia, em clara violação da lei [3]. Bastaram dois anos para confirmar a justeza desses avisos.
Porém, para os dois responsáveis máximos por estes assuntos na Madeira - o Presidente do Governo Regional e o Presidente da Câmara do Funchal - estes avisos não passavam de calúnias de «alguns irresponsáveis». Na sua perspectiva tudo estaria em ordem. Tudo estaria nos lugares certos. Á excepção da natureza.
Como é sua missão, rapidamente a Comunicação Social corporativa se apressou dar cobertura a esta versão e a apresentar a situação como uma «catástrofe natural». Para ela solicitavam a habitual onda de solidariedade em part time, vulgo caridade, afastando assim, subliminarmente, qualquer responsabilidade humana no assunto.
O planeamento do território, a prevenção, bem como o seu cumprimento rigoroso, não fazem parte do ideário do capitalismo, seja ele aplicado por socialistas, democratas-cristãos ou social-democratas, como é o caso. Sem planos urbanísticos a especulação imobiliária avança melhor. E com ela aumentam a incúria e o desleixo, multiplicam-se os erros. Se algo correr mal, como agora, serão assacadas responsabilidades à natureza. Tal procedimento até pode ser útil: fazer reverter a reconstrução não como prejuízo, mas como vantagem para a economia (de alguns). Ao contrário do aforismo popular, a sua máxima parece ser «mais vale remediar do que prevenir».

(continua)

Guilherme Alves Coelho
Nov.2010

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