sexta-feira, 29 de julho de 2011

Negócios verdes e tendências do mercado de consumo

Illustration of a Toyota Prius.Image via Wikipedia



António Campos


As ameaças ambientais globais são uma realidade desde os anos 70. Nessa altura, ganhou-se consciência de uma questão perturbadora que era a ruptura da camada de ozono, a chamada sombrinha da Terra. No final da década, num acontecimento sem precedentes e até hoje irrepetível, graças ao Protocolo de Montreal, os representantes dos Estados, os grandes fabricantes e todos os envolvidos desde a investigação científica até às forças do mercado se puseram de acordo para retirar os danosos gases denominados CFC, substituindo-os por produtos menos lesivos para o ambiente.

A década de 80 conheceu outros desafios, uns que afectaram a área da produção e que tiveram a ver com a gasolina sem chumbo e a erradicação dos responsáveis pelas chuvas ácidas, outros pelo nascimento da chamada consciência ecológica ao nível dos consumidores. A ciência e as indústrias conseguiram remover os produtos mais perigosos e progressivamente avançou-se para um automóvel ambientalmente menos agressivo e para a aplicação de técnicas mais limpas para a extracção de minérios, por exemplo. Lançaram-se operações de substituição de matérias-primas para embalagens, gradualmente encontraram-se soluções para os detergentes, generalizou-se a separação de resíduos sólidos urbanos, tornaram-se obrigatórias novas formas de aterros para depósito desses resíduos, apareceram em massa as estações de tratamentos de águas residuais, etc. Nos anos 90 era facto assente que a consciência ambiental estava a implantar-se no mercado e a ter uma forte popularidade na opinião pública. Na Cimeira da Terra (1992) convencionou-se que havia de se pôr termo aos padrões de produção e consumo insustentáveis.

“Green Target, As novas tendências do marketing”, por Carolina Afonso (SmartBook, 2010) é uma reflexão interessante sobre esta caminhada, tanto no terreno dos negócios como na consciência ambiental dos consumidores. O green market ou marketing verde é um processo de gestão global que visa a satisfação das necessidades dos clientes e da sociedade, não só de forma lucrativa mas também sustentável, escreve-se no prefácio. Tem a ver com a modificação de produtos, embalagens e as comunicações comerciais em geral. Como se sabe, não existem produtos ecológicos, o que existem são produtos ambientalmente menos agressivos.

 Quanto à consciência ecológica, ela é hoje um dado estruturante, é um dos elementos a considerar no paradigma ambiental para onde concorrem outros de não menor importância, como é o caso do culto da forma, dos cuidados cosméticos, da saúde, do consumo responsável e sustentável, do comércio justo, da ajuda humanitária, etc. etc. Os factores emergentes da crise financeira desencadeada em 2008 acentuaram algumas destas preocupações, mas não é descabido prever que alguns dados fundamentais da consciência ambiental vão conhecer retrocesso ou estagnação provisórios: o refluxo do poder de compra, o desemprego acentuado, implacavelmente, roubam espaço à consciência ambiental do mesmo modo que se vai ouvir falar muito menos da responsabilidade social, da pegada ecológica e do comércio justo. Muito provavelmente, ir-se-á ouvir falar muito mais de alternativas energéticas, de automóveis híbridos, de produtos brancos, de electrodomésticos com eficiência energética. O Estado promoverá com incentivos tais técnicas e tais opções de consumo.

O que nos propõem o longo ensaio de Carolina Afonso? Enquadra em primeiro lugar os vectores da consciência ecológica, o conceito de marketing verde, a par da responsabilidade social empresarial e como esta se enlaça com a consciência ecológica. Dá conta do mercado de produtos verdes e da gama de questões que eles suscitam. Refere os produtos sustentáveis de acordo com a definição de um especialista: produtos cíclicos, com base em energias renováveis, seguros e eficientes, o mesmo quer dizer que todos os materiais utilizados funcionam num sistema cíclico, toda a energia utilizada provém de energias renováveis, não só emitidas substâncias nocivas para o ambiente m qualquer uma das fases do ciclo do produto, e o consumo de recursos total equivale a 10% quando comparado com um produto desenvolvido em 1990. Seguidamente, explana os desafios que se levantam à comunicação verde e denuncia mesmo os casos mais gravosos da publicidade enganosa, concluindo com a apresentação do que deve ser uma comunicação verde mais eficiente e credível aos olhos do consumidor. Refere depois a problemática da rotulagem ecológica que como é sabido continua a ser uma questão menor (ou mesmo menoríssima) do funcionamento do mercado. Temos, em sequência, o estudo do comportamento de compra do consumidor verde que têm sido alvo de leituras muito controversas. Na verdade, constata-se que os inquiridos sentem uma ampla margem de liberdade para confessarem estarem dispostos a adoptar atitudes de consumo sustentável que são contraditados pelos seus efectivos comportamentos de compra. Os factores preponderantes de compra, goste-se ou não, andam à volta do preço e da satisfação do consumidor. O que lembra muito a agricultura biológica e os respectivos consumidores, são as classes médias com mais elevado poder aquisitivo que procuram adoptar comportamentos que podem ser encarados como sustentáveis.

Onde, inegavelmente, se nota uma viragem é na atitude face ao transporte, na escolha de um carro menos energívoro, nas compras que levem à redução do consumo de energia eléctrica, à separação dos lixos e ao abandono de bens de consumo mais caros e mais poluentes (aerossóis, sabonetes líquidos, detergentes não compactos…). Duvidamos pois do estudo apresentado pela autora e da conclusão de que existe uma relação entre a intensão de compra e a compra efectiva de produtos verdes. Que os inquiridos revelem um comportamento ecologicamente consciente de grau elevado, não surpreende. Não custa nada responder de que se é amigo do ambiente, solidário, altruísta e que compra frequentemente produtos verdes. O mercado verde é tão pequeno que não será abanado por tanta declaração piedosa.

Os case study apresentados são muito ricos pois tem a ver com o Toyota Prius, um híbrido que é um verdadeiro desafio para a redução de poluentes e o Programa de Eficiência Energética da EDP é suficientemente promissor em si para não ser alvo de nenhuma contestação demolidora.

O consumidor verde existe, mesmo que não tenha a elevada consciência ecológica que a autora lhe augura. O seu ensaio é um bom ponto de partida para novos trabalhos e um sério aviso ao marketing verde para não brincar mais com coisas sérias, como é o caso da sustentabilidade.

Beja Santos
Nov.2010

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