"2. Primeira etapa: a pré-existência.
Se a criança entende ou não, é a pergunta para o
começo da vida da mesma, definida desde a sua aparente pré-existência. Como já
tenho dito e gostava de repetir, a criança é mais um facto cultural de como
pequenos e adultos entendem aos cronologicamente mais novos do que um processo da
realidade social. A questão é simples: o que é esse entender ou não de se ser
criança e o que é que é possível falar em frente do, cronologicamente, mais
novo? Os mais novos caracterizam-se por chorarem, às vezes sem motivo
entendível. O pranto dos pequenos pode ser resultado de ouvir uma voz
autoritária que faz correr, pensar, sentir, desesperar, se não conhecemos o
motivo e a pessoa. Esse ser novo chora e ri desde o seu primeiro dia de
existência. Os analistas de pequenos têm defendido que o bebé, como ser humano
que sente e é emotivo, começa na gestação e, antes ainda, no imaginário dos
pais que pensam produzir um ser humano. Defensor desta ideia é o referido
Winnicott, bem como o conhecido Cyrulnik. É a ilusão dos adultos que leva a
este tipo de pensamentos. “Como é que será o bebé,
semelhante a quem, a cor dos olhos? E outras questões que são
colocadas pelos progenitores. Não resisto sintetizar o que a escola francesa
organicista de psicologia tem acumulado em saber no assunto do imaginário e da
gestação de um outro ser humano e o papel de destaque atribuído aos
progenitores durante a gravidez, especialmente o papel cultural alimentar e
emotivo da mãe. A história analisada por eles, é assim:
“L’histoire
de l’enfant commence dans l’imaginaire des parents. On l’imagine grand, beau, fort et plus tard riche. A partir du moment où on
est deux (couple), on est déjà trois, même si l’enfant n’est pas encore pensé
consciemment. Il y a toujours dans le désir d’avoir un enfant un besoin
personnel à assouvir. Durant les
9 mois de grossesse, les parents font le deuil de l’enfant imaginaire. On
divise les 9 mois en 3 périodes.
1ère période : Incorporation. Il faut
acquérir l’identité maternelle, l’assimiler d’après la propre histoire de la
femme : Quand elle était nourrisson, d’après ses rapports avec sa propre mère,
son propre père, sa conception de l’enfant. Cela provoque chez
la femme une régression. Elle se voit petite-fille, elle rêve beaucoup de son
enfance (souvenirs). Elle pourra aborder sa grossesse soit comme un événement
heureux, valorisant, soit avec l’angoisse due à la déformation corporelle, à la
fatigue. L’ambivalence
des sentiments de refus et d’acceptation pourra entraîner des vomissements, des
malaises, des dégoûts…de l’instabilité. Les modifications
hormonales toucheront l’humeur, la sexualité… La femme s’installe dans son
nouveau statut, non sans heurts.
2ème période : L’enfant est
accepté, il bouge, se distingue de la mère. C’est une période
sereine. La femme se suffit à elle-même, son corps s’épanouit. Elle ressent une
grande sensibilité au monde extérieur. Elle a retrouvé son dynamisme et éprouve
beaucoup de bonheur à fabriquer son fœtus. (Notons qu’à ce niveau là, certaines
femmes ressentiront de l’angoisse à l’idée de porter un être vivant, étranger à
elles et vécu comme un parasite). La femme commence
à concevoir son enfant comme différent d’elle. Le père acquiert son identité de père. Il
aide psychologiquement la mère à porter l’enfant.
3ème période : Travail de
séparation. Les parents confrontent l’enfant imaginaire à l’enfant réel. Un
processus de deuil commence. L’enfant existe. Le processus de deuil doit être
achevé à l’accouchement. L’enfant naîtra réel, autonome et différent. La femme
pense à son accouchement, craint les douleurs, le risque de l’enfant mort-né,
ou anormal.
L’enfant imaginaire est là pour combler un manque chez
les parents. Après la naissance, l’enfant devient d’un coup réel. Cela n’est
pas toujours accepté par les parents. Le deuil est donc là nécessaire.
Cas de malformation à la naissance : Ce qui est
important n’est pas qu’un enfant soit incomplet mentalement ou physiquement,
mais la façon dont les parents vivent cette incomplétude. Ils pourront y voir
une punition, renforçant ainsi la tare chez l’enfant, le confirmant dans son
état d’infériorité. Il
pourra aussi y avoir de la culpabilisation vis à vis des grands-parents, qui eux
ont bien réussi leur travail. Le role maternal será alors plus difficile à
acquérir.[19]”
Esta extensa citação da Escola da Etnopsicologia francesa na que
trabalhamos juntos com Georges Devereux, na Maison de Sciences de l´homme,
comenta-se por si só, apesar de tanto o autor me ter obrigado a entregar estes
elementos para saber e lembrar o argumento da procriação e criação de pequenos
e dar assim bases analíticas aos leitores. É preciso lembrar apenas três
pontos: o primeiro, é que esta é uma, citação do texto da Associação Géza
Róheim[20], que
define a fundação da Etnopsicologia – atribuída também ao Húngaro Róheim, mas
que a História entrega e atribui ao alemão Emil Kraepelin (5 de Fevereiro de1856 – 7 de
Outubro de 1926), por causa dos seus estudos de método comparado
entre europeus de diversos grupos sociais, e os nativos de Java com os
artefactos da sua cultura reunidos no Museu que orientava em Hamburgo, e cujas
viagens à Índia tiveram por objectivo comparar os conceitos fundados sobre
Esquizofrenia e Mania Depressiva, com doenças dos nativos de Java no asilo[21] gerido pelos holandeses. Os seus
primeiros textos contextualizam culturas e delimitam a influência que as formas
de comportamento normativo social exercem sobre as, nesse tempo, denominadas
demências: a forma cultural ensina que não há alcoolismo, mas sim epilepsia,
causada pela traição da mulher amada, ou ver o sangue à morte de uma pessoa
querida, ou, ainda, ver derramar sangue dos seus consanguíneos ou o facto de
entidades míticas denominadas l’amok e le latah, entidades culturais legendárias a agir entre
o povo, facto perante o qual se reage, como descreve Gilmore Ellis no The Journal of Mental Science.
Doenças que são comportamentos, estudados e descritas por Kraepelin e que Gilmore Ellis analisa na referida revista: “A ideia que insanidade é rara entre os povos primitivos e que ela tende a aumentar em proporção ao processo civilizatório surgiu pela primeira vez no século XIX. Psiquiatras importantes daquela época defenderam a ideia que existiria uma íntima relação entre civilização e doença mental. A ideia do “bom selvagem”, proposta pelo filósofo e reformador francês Russeau, ainda era forte. Começaram a descobrir doenças mentais que eram restritas a povos primitivos, tais como o amok e o latah, entre os nativos de Java; koro, entre os chineses em Java; o myriath, na Sibéria, pilokto entre os esquimós, etc. Assim, nasceu uma nova abordagem, a assim chamada “psiquiatria cultural do exótico”, a qual evoluiu até o presente conceito de síndrome delimitada pela cultura ( ”culture-delimited syndrome”) Pela primeira vez, o pensamento psiquiátrico buscava fora do seu berço de nascimento uma prova para o valor universal de suas categorias de doença mental. O grande psiquiatra Emil Kraepelin foi um dos primeiros a fazer extensas viagens ao Oriente e examinar pacientes psicóticos entre povos primitivos, tais como na ilha de Java.[22]. O conceito de síndrome culturalmente limitado é central para o entendimento de não termos doentes mentais, mas sim uma relação entre pessoas, etnocentrismo e a sua cultura, com o perigo do afastamento das definições comandadas pela prática e a tradição."(…)
Raul Iturra
Julho 2011
Aventar
Sem comentários:
Enviar um comentário