Duane Elgin - GreenFestival 2010 (Photo credit: Franco Folini) |
António Campos
Há algumas décadas atrás, falou-se ao de
leve no mundo ocidental no apelo à simplicidade voluntária. Um pensador,
escritor e orador consagrado, de nome Duane Elgin, fazia apelo a uma vida
simples em contra posição à pressa da sociedade industrial, à imagem de sucesso
desencadeada nos cidadãos mediante um consumo desenfreado e exponencial.
Em 2010, Duane Elgin reorganizou tudo
quanto escrevera dado que se tinha operado uma mudança sísmica nos estilos de
vida havendo necessidade de remexer de alto abaixo na simplicidade voluntária.
O seu livro já está publicado entre nós: “Simplicidade Voluntária”, por Duane
Elgin, Estrela Polar, 2010. Di-lo, com meridiana clareza, na apresentação do
seu novo livro: “Nos anos 70, o público preocupava-se pouco com as mudanças
climáticas, as grandes fomes, a falta de água e de energia e outras coisas
mais. Vivia-se centrado no curto prazo. Mais de 30 anos depois, estes problemas
já não pertencem a um futuro distante. Representam um desafio crítico à
comunidade humana, agora.
Quanto mais de perto olhamos, mais forte é
a evidência em como a família humana excedeu a capacidade da Terra para
sustentar os seus actuais níveis de consumo, já para não falar nos que se
prevêem para o futuro. São necessárias mudanças dramáticas e globais para
evitar um futuro de calamidade imensas”. Duane Elgin considera que a nova
sabedoria económica está consciente que consumir moderada, diversa e
inteligentemente gera empregos sustentáveis e saúde mundial a longo prazo. A
simplicidade foi até agora definida como aquilo para que serve e não aquilo a
que se opõe. A nova simplicidade tem que se impor como um processo voluntário,
uma escolha consciente, baseada em motivos muito fortes: uma relação mais
harmoniosa com a Terra; ser um instrumento promotor de justiça e de aumento de
recursos disponíveis para as gerações futuras. Nesse contexto, a simplicidade
voluntária não é um sacrifício, é uma deliberação de ter uma vida com sentido,
com uma ligação mais estreita com a natureza e recorrendo a uma abordagem
integrada da vida.
O autor desmonta os conceitos errados
postos a circular sobre a vida simples: a simplicidade não significa pobreza,
já que a pobreza involuntária gera uma sensação de impotência enquanto as
escolhas alimentares simples decorrem de um envolvimento criativo (aqueles que
escolhem uma vida simples procuram um equilíbrio criativo e estético entre a pobreza
e o excesso); a simplicidade não significa vida rural, para ser simples não é
preciso regressar à terra, morar dentro de um bosque, numa cabana, o que está
em causa é saber tirar todas as potencialidades do sítio onde se vive,
adaptando-se criativamente a um mundo em rápida mudança; simplicidade não
significa vida feia, um primitivismo onde se nega o valor da beleza e da
estética, pelo contrário a simplicidade revela o sentido estético ao libertar
as coisas de estorvos artificiais; a simplicidade não significa estagnação
económica pois, apesar de ser verdade que o nível e os padrões de consumo serão
diferentes numa sociedade que valoriza a sustentabilidade, numa economia amiga
da Terra, não haverá falta de oportunidades de emprego, a economia orientar-se-á
para necessidades que não inflacionarão artificialmente os desejos dos
consumidores.
A tese dos anos 70 sobre a simplicidade
voluntária foi concebida num mundo com petróleo barato com muito menos
população e um clima muito mais estável, estando a abundância fundamentalmente
concentrada nos países superindustrializados. É hoje muito elevado o número
daqueles que sabe que a terra é um sistema único e que nós já ultrapassámos o
seu limite de regeneração. É por isso que é urgente inventarmos novos estilos de
vida que sejam sustentáveis. A sustentabilidade não tem regulamentos
padronizados ou normas rígidas, há por aí milhões de pessoas a improvisar
estilos de vida menos agressivos recorrendo a pequenas acções do dia-a-dia.
Optar por uma vida mais leve quer dizer muita coisa: encontrar um equilíbrio
saudável entre a experiência interior e a sua expressão exterior no trabalho,
consumo, relacionamentos; alcançar um nível de independência e autodeterminação
muito superior numa sociedade de massas; estabelecer relações mais cooperantes
e amigáveis; aprender a lidar com a poluição ambiental e a escassez de
recursos, por exemplo. Para Duane Elgin, o caminho para uma vida simples é
conseguir mudanças para se passar de consumidor a conservador; é um crescimento
interior, um processo de aprendizagem da tranquilidade natural da mente. A
pessoa que procura a simplicidade encontra novas riquezas (a começar pelo
aprofundamento das relações), ganha gosto por se inserir na sua comunidade e
nas suas múltiplas actividades. O autor observa: “Enquanto a perspectiva
política tradicional das nações industriais do Ocidente tende a enfatizar os
interesses nacionais, as preocupações materiais e o uso de violência nas
relações com o exterior, a política da simplicidade tende a dar importância aos
interesses do planeta, às considerações equilibradas do desenvolvimento
material e espiritual”.
Esta simplicidade pode manifestar-se de
muitas maneiras: um ganha-pão com significado; o sentimento de uma satisfação
interior, viver mais conscientemente, descobrindo os prazeres na harmonia entre
o bem-estar, o crescimento pessoal, as relações sociais fortes, a
disponibilidade para servir os outros e a ligação à Natureza. Pensando
concretamente no consumo, é importante que cada um decida o que é “suficiente”,
aprendendo a compreender a diferença entre desejos e necessidades (necessidades
são as coisas essenciais à sobrevivência e ao crescimento e os desejos são as
coisas extra). A generalizarem-se os princípios da simplicidade, a humanidade
ganhará em paz e desenvolvimento, será mais fácil reduzir a pobreza, encontrar
soluções para a ruptura climática, substitutos do petróleo e respeitar a
biodiversidade, em suma dar luta sem tréguas à pegada global insustentável.
Corremos sérios riscos de reagir defeituosamente
à crise mundial em que vivemos, por exemplo procurando soluções de fuga ou
sentirmo-nos impotentes ou negarmos as tensões actuais, minimizando-as e
considerando que as coisas irão voltar rapidamente ao normal. É preciso
encontrar a sabedoria necessária para atravessarmos este período crucial. A
propósito do consumismo, observa Duane Elgin: “O consumo e a exploração da
Terra são resultados directos e previsíveis do paradigma de um universo não
vivo. Em alternativa, se o encararmos como um sistema vivo, então é apenas
natural que procuremos a felicidade no sumo da vida, nas relações com os
outros, com a natureza e connosco. Vivendo num universo vivo, tentaremos
naturalmente reduzir os rebuliços, complexidades e confusões desnecessárias na
parte material das nossas vidas”. Uma vida dedicada à simplicidade salda-se em
sustentabilidade, aprendendo a cuidar e a respeitar o clima, a energia, a água,
todos os recursos naturais, aprendendo a pôr em marcha o poder do amor. Sim, é
possível tomar a iniciativa e sentir a responsabilidade de colaborar neste
desafio de um futuro sustentável e consentido. Como diz o autor, “se vencermos
o desafio de viver com maior consciência e simplicidade, espera-nos uma nova
dimensão de oportunidade humana”.
Beja Santos
Jan.2011
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