quarta-feira, 21 de março de 2012

Simplicidade voluntária - para ter um estilo de vida com alma e sustentabilidade

Duane Elgin - GreenFestival 2010
Duane Elgin - GreenFestival 2010 (Photo credit: Franco Folini)


António Campos



Há algumas décadas atrás, falou-se ao de leve no mundo ocidental no apelo à simplicidade voluntária. Um pensador, escritor e orador consagrado, de nome Duane Elgin, fazia apelo a uma vida simples em contra posição à pressa da sociedade industrial, à imagem de sucesso desencadeada nos cidadãos mediante um consumo desenfreado e exponencial.

Em 2010, Duane Elgin reorganizou tudo quanto escrevera dado que se tinha operado uma mudança sísmica nos estilos de vida havendo necessidade de remexer de alto abaixo na simplicidade voluntária. O seu livro já está publicado entre nós: “Simplicidade Voluntária”, por Duane Elgin, Estrela Polar, 2010. Di-lo, com meridiana clareza, na apresentação do seu novo livro: “Nos anos 70, o público preocupava-se pouco com as mudanças climáticas, as grandes fomes, a falta de água e de energia e outras coisas mais. Vivia-se centrado no curto prazo. Mais de 30 anos depois, estes problemas já não pertencem a um futuro distante. Representam um desafio crítico à comunidade humana, agora.

Quanto mais de perto olhamos, mais forte é a evidência em como a família humana excedeu a capacidade da Terra para sustentar os seus actuais níveis de consumo, já para não falar nos que se prevêem para o futuro. São necessárias mudanças dramáticas e globais para evitar um futuro de calamidade imensas”. Duane Elgin considera que a nova sabedoria económica está consciente que consumir moderada, diversa e inteligentemente gera empregos sustentáveis e saúde mundial a longo prazo. A simplicidade foi até agora definida como aquilo para que serve e não aquilo a que se opõe. A nova simplicidade tem que se impor como um processo voluntário, uma escolha consciente, baseada em motivos muito fortes: uma relação mais harmoniosa com a Terra; ser um instrumento promotor de justiça e de aumento de recursos disponíveis para as gerações futuras. Nesse contexto, a simplicidade voluntária não é um sacrifício, é uma deliberação de ter uma vida com sentido, com uma ligação mais estreita com a natureza e recorrendo a uma abordagem integrada da vida.

O autor desmonta os conceitos errados postos a circular sobre a vida simples: a simplicidade não significa pobreza, já que a pobreza involuntária gera uma sensação de impotência enquanto as escolhas alimentares simples decorrem de um envolvimento criativo (aqueles que escolhem uma vida simples procuram um equilíbrio criativo e estético entre a pobreza e o excesso); a simplicidade não significa vida rural, para ser simples não é preciso regressar à terra, morar dentro de um bosque, numa cabana, o que está em causa é saber tirar todas as potencialidades do sítio onde se vive, adaptando-se criativamente a um mundo em rápida mudança; simplicidade não significa vida feia, um primitivismo onde se nega o valor da beleza e da estética, pelo contrário a simplicidade revela o sentido estético ao libertar as coisas de estorvos artificiais; a simplicidade não significa estagnação económica pois, apesar de ser verdade que o nível e os padrões de consumo serão diferentes numa sociedade que valoriza a sustentabilidade, numa economia amiga da Terra, não haverá falta de oportunidades de emprego, a economia orientar-se-á para necessidades que não inflacionarão artificialmente os desejos dos consumidores.

A tese dos anos 70 sobre a simplicidade voluntária foi concebida num mundo com petróleo barato com muito menos população e um clima muito mais estável, estando a abundância fundamentalmente concentrada nos países superindustrializados. É hoje muito elevado o número daqueles que sabe que a terra é um sistema único e que nós já ultrapassámos o seu limite de regeneração. É por isso que é urgente inventarmos novos estilos de vida que sejam sustentáveis. A sustentabilidade não tem regulamentos padronizados ou normas rígidas, há por aí milhões de pessoas a improvisar estilos de vida menos agressivos recorrendo a pequenas acções do dia-a-dia. Optar por uma vida mais leve quer dizer muita coisa: encontrar um equilíbrio saudável entre a experiência interior e a sua expressão exterior no trabalho, consumo, relacionamentos; alcançar um nível de independência e autodeterminação muito superior numa sociedade de massas; estabelecer relações mais cooperantes e amigáveis; aprender a lidar com a poluição ambiental e a escassez de recursos, por exemplo. Para Duane Elgin, o caminho para uma vida simples é conseguir mudanças para se passar de consumidor a conservador; é um crescimento interior, um processo de aprendizagem da tranquilidade natural da mente. A pessoa que procura a simplicidade encontra novas riquezas (a começar pelo aprofundamento das relações), ganha gosto por se inserir na sua comunidade e nas suas múltiplas actividades. O autor observa: “Enquanto a perspectiva política tradicional das nações industriais do Ocidente tende a enfatizar os interesses nacionais, as preocupações materiais e o uso de violência nas relações com o exterior, a política da simplicidade tende a dar importância aos interesses do planeta, às considerações equilibradas do desenvolvimento material e espiritual”.

Esta simplicidade pode manifestar-se de muitas maneiras: um ganha-pão com significado; o sentimento de uma satisfação interior, viver mais conscientemente, descobrindo os prazeres na harmonia entre o bem-estar, o crescimento pessoal, as relações sociais fortes, a disponibilidade para servir os outros e a ligação à Natureza. Pensando concretamente no consumo, é importante que cada um decida o que é “suficiente”, aprendendo a compreender a diferença entre desejos e necessidades (necessidades são as coisas essenciais à sobrevivência e ao crescimento e os desejos são as coisas extra). A generalizarem-se os princípios da simplicidade, a humanidade ganhará em paz e desenvolvimento, será mais fácil reduzir a pobreza, encontrar soluções para a ruptura climática, substitutos do petróleo e respeitar a biodiversidade, em suma dar luta sem tréguas à pegada global insustentável.

Corremos sérios riscos de reagir defeituosamente à crise mundial em que vivemos, por exemplo procurando soluções de fuga ou sentirmo-nos impotentes ou negarmos as tensões actuais, minimizando-as e considerando que as coisas irão voltar rapidamente ao normal. É preciso encontrar a sabedoria necessária para atravessarmos este período crucial. A propósito do consumismo, observa Duane Elgin: “O consumo e a exploração da Terra são resultados directos e previsíveis do paradigma de um universo não vivo. Em alternativa, se o encararmos como um sistema vivo, então é apenas natural que procuremos a felicidade no sumo da vida, nas relações com os outros, com a natureza e connosco. Vivendo num universo vivo, tentaremos naturalmente reduzir os rebuliços, complexidades e confusões desnecessárias na parte material das nossas vidas”. Uma vida dedicada à simplicidade salda-se em sustentabilidade, aprendendo a cuidar e a respeitar o clima, a energia, a água, todos os recursos naturais, aprendendo a pôr em marcha o poder do amor. Sim, é possível tomar a iniciativa e sentir a responsabilidade de colaborar neste desafio de um futuro sustentável e consentido. Como diz o autor, “se vencermos o desafio de viver com maior consciência e simplicidade, espera-nos uma nova dimensão de oportunidade humana”.

Beja Santos
Jan.2011

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