terça-feira, 12 de abril de 2011

A criança abandonada

aloneImage by zeynep'arkok via Flickr



António Campos


abandonada não apenas de comida, mas sim de carinho...

 Falar em crianças, é uma tarefa difícil. Pensamos que sabemos tudo sobre elas e tratamo-las como melhor nos parece, ou reparamos nada saber e mimamos um ser que toma vantagem da dor dos pais, que vivem arrependidos desse nada saber. Arrependimento reflectido nas suas caras e nos presentes oferecidos, na simpatia usada para matar a dor da falta de apreço do seu comportamento. Quando nada se sabe sobre criar filhos, a dor bate nos progenitores.

O desconhecimento de como tomar conta de uma criança é uma maneira de a abandonar. No lado oposto, há os que pensam tudo saber, mandando nela como se fosse escrava: punem, corrigem, batem, e enviam-na para a solidão do quarto. Em sociedades patriarcais, como a nossa, onde é o elemento masculino do grupo doméstico, quem dá menos carinho, arremete mais sobre os seus filhos e pede-lhes contas, de manhã à noite. Sem nada, devem inventar, como tenho observado no meu trabalho de campo em várias aldeias e diferentes continentes. Especialmente se o dia se passou sem se fazer nada de produtivo aos olhos dos pais, ou se a produtividade desejada, vira jogo de berlindes, da macaca ou na exploração do mato com os seus camaradas.

Tenho narrado noutros textos, a existência de uma diferença entre menino e menina. Esta segunda pessoa tem o seu tempo todo ocupado. As sociedades patriarcais usam e abusam das senhoras desde novas: nos trabalhos na cozinha, no coser e remendar das roupas e na permanência junto da mãe para saberem como é que a vida deve recorrer dentro do lar, estudem ou não.

Bem sabemos que o estudo é obrigatório e obter uma boa avaliação, a recompensa aos esforços que um dia podem levar à Universidade e às profissões doutorais. Mas, isto acontece a uma pequena fatia do nosso país, especialmente em tempos de crise como a que vivemos actualmente. Os rapazes são enviados a trabalhar em qualquer actividade que dê lucro, moedas que devem ficar sempre em casa para um fundo familiar que pode ajudar quando o dinheiro é escasso. A criança é abandonada às suas habilidades para lucrar e prestar contas ao patrão da obra e ao patrão da casa, que guarda o dinheiro.

Uma terceira forma de abandono que tenho observado, é o descarinho que desencaminha da afectividade e cuidados de pequenos afectos as crianças. Quando a criança é bebé, é o amor dos amores dos progenitores que observam como cresce e as gracinhas que faz. Hoje em dia, é raro ver esse carinho, porque pais e mães trabalham e os mais novos ou ficam com alguém da família, una avó normalmente, ou vão para o infantário e, hoje em dia também, ao pré infantário, tanta é a necessidade dos raros euros que os nossos bolsos podem suportar, transitar ou guardar.

Uma quarta forma de abandono, é esse não saber o abecedário do corpo da sua fisiologia e de como num curto espaço de tempo deve mudar. Entre rapazes, as mudanças fisiológicas é aprendida dos mais atrevidos do grupo, que começam nos denominados sonhos molhados, e continua por uma masturbação colectiva, até encontrar, já púbere, a pessoa dos seus desejos com quem faz amor. Nos dias de hoje, todo o namoro, começa logo numa relação sexual íntima, que pode ou não continuar ao longo do tempo.

Mas o maior dos abandonos, é não tratar as crianças de forma carinhosa, com mimos e carícias, divertimentos e jogos entre todos os parentes que moram debaixo do mesmo tecto, não se fomenta a leitura conjunta nem se comentam os livros durante as refeições.

Finalmente, a criança mais abandonada, é a que é colocada em internatos, casas de amas, colégios de sacerdotes, apesar do que hoje todos sabemos e os pais querem ignorar pela vergonha que este facto causa e que deve ficar apenas dentro da família.

Uma criança abandonada, é a pior das felonias que um adulto pode cometer. Especialmente se a criança é abandonada em locais em que é abusada. Nestes últimos anos é que começamos a saber como adultos consagrados usam os seus estudantes, púberes ou não, para satisfazer a sua sexualidade.

E mais nada digo, a criança abandonada acaba por ser um adulto sem carinho: não teve de onde aprender!

Raul Iturra
Nov.2010

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