sábado, 9 de março de 2013

3. OUVIR, LER, ESCREVER, DEBATER, PROVAR: UMA DIVISÃO DO TEMPO LECTIVO (IV)



 
 Raul Iturra

Feita a apreciação faço agora uma proposta que há tempos elaborei com os que hoje são os meus colaboradores. Não será novidade nenhuma dizer que o processo de aprendizagem é resultado do cálculo reprodutivo que uma sociedade faz da sua particular teoria económica – i. e, a sua particular maneira de entender as relação que há entre pessoas, coisas, gerações de ideias e relação com o saber herdado. O que custa mais entender é que se desconheça e não se aceite o facto. Talvez exista aí um outro desencontro entre a oralidade e a escrita; entende-se que a educação é nobre, uma arte do sacrifício, um culto do sublime que quanto mais longe do real fica, mais requintada e erudita acaba por ser. Esta ideia não acontecerá enquanto o mundo continuar a acreditar que é humanista. Entretanto podíamos tentar definir alguns pequenos princípios de técnica pedagógica. O primeiro, é que a aula é só uma parte do processo de aprender e introduz os conceitos com a maior economia de palavras do docente e o silêncio do discente, enquanto não faça o resto. O resto é ler o texto que foi explicado, ainda em tempo de aula, sobre o qual faça o seu próprio texto necessariamente repetitivo, só que com palavras e gralhas próprias. Texto que entrega ao docente para discutir com ele de igual para igual, no sentido de autoridade: o autor do texto com o introdutor dos conceitos; debate no qual o estudante se treina na prova com factos do que é dito, ou pelo menos com a contextualização teórica do seu texto. Parece uma forma não fácil de aplicar devido ao exíguo número de docentes perante o alto número de estudantes. É por isso que há que gerir o tempo lectivo de forma a diminuir o número de aulas para dar tempo ao tal resto. Só que entro aqui num tempo minado: o do docente que pensa de forma sagrada no valor transformador da sua própria palavra, ideia derivada da existente na nossa cultura cristã em que o verbo transforma: e o Ministério, que controla com todo o ciúme a fabricação do cidadão, mesmo a custo da produção de pessoas que aprendem a saber o que daria uma melhor utilidade marginal. Só que ia querer ser partilhada por mais pessoas do que apenas por quem apropria o lucro, pelo que, esta parte da minha teoria fica guardada para melhores dias.

BIBLIOGRAFIA

DURKHEIM, Émile 1922, Education et Sociologie, Felix Alcan, Paris. (Há uma edição das aulas de Educação e Ética em português, Res, Porto, 1988)
GOODY, Jack e WATT, Ian 1968:”The consequences of Hteracy” in J. Goody (coord), Literacy in Traditional Societies, C.U.P., U.K. (Há outras obras do autor em Português: A domesticação do pensamento selvagem,Presença, Lisboa, 1988; e A Lógica da escrita e a organização da sociedade, Horizonte, Lisboa 1989. A primeira é de 1974 pela Cambridge University Press, e a segunda de 1986 pela mesma editora)
GOUGH, Katherine, 1968: “Implications of literacy in China and India”, in J. Goody (coord) Literacy in traditional societies, C.U.P., U.K.
GODELlER, Maurice 1982 : La production des Grandes Hommes, Fayard, Paris
FORTES Meyer, 1970: “Social and psychological aspects of education in Tatelend”, in Time and Social Structure and other essays, Cambridge University Press, U.K.
FIRTH, Raymond, 1929: Primitive Economics of lhe New Zealand Maori, Routledge and Kegan,London.

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