quinta-feira, 24 de junho de 2010

Também há ordem no caos

Ordre i caos // Order & ChaosImage by ~Oryctes~ via Flickr


António Campos




Exige a nossa atenção tudo o que se vai passando em Portugal e no mundo. A falência previsível do euro, o esmagamento dos direitos dos trabalhadores o repulsivo aproveitamento do direito constitucional à fé e à convicção para mais facilmente se abrirem novos caminhos à exploração do homem e ao retorno da noção de que a religião actua, natural e inevitavelmente, como «ópio do povo». Este quadro de intervenção política revela-se agora, impunemente, na visita de Estado de um papa ultra-conservador (no mínimo) ao nosso país, nos negócios confessos da Igreja, nos comportamentos contraditórios de uma classe política dirigente que se afirma republicana e laica e nos silêncios da hierarquia religiosa aparentemente em comunhão com as angústias do povo português mas que, activamente, colabora e promove o afundamento nacional no pântano económico e social.

Crescem o desemprego e as falências em cadeia. Generaliza-se a prática da corrupção. Aumentam, em flecha, os índices de intervenção estrangeira na economia e na política interna portuguesa. Cresce a dívida pública. Os órgãos de comunicação baqueiam, um após outro, e entregam-se ao poder do capital. A democracia começa a ser um esboço ridículo da sua imagem inicial de liberdade da crítica.

A Igreja continua a ser igual a si própria, superficialmente com uma imagem de modernidade polida a custo mas conservando as marcas da Idade Média. Mete-se na concha e tece intrigas. Aceita as homenagens dos ricos e poderosos e aproveita essas alianças para promover os seus próprios negócios e alargar as suas influências. Politicamente, o seu imobilismo ancora em dois velhos princípios com carácter dogmático: «riqueza e pobreza são mistérios transcendentes»; e «o poder não deve cair na rua». Ou seja: ricos e pobres existem «porque Deus o quer»; e «jamais o homem deve tomar o seu destino pelas suas mãos». Padres, leigos e organizações confessionais respeitam piedosamente esta conduta. São espectadores onde deveriam ser actores da mudança. Assistem, impávidos, ao soçobrar do País e correm velozmente atrás dos benefícios que o caos para alguns sempre produz.

O Papa (este e os outros) é o representante de Cristo na terra, o Vigário de Deus e o máximo responsável pela Igreja católica. Sócrates, como todos sabemos, é um comparsa menor. Serve, apenas, para reabrir portas que a Revolução de Abril encerrara. Meteu-se na catástrofe do «euro» e não sabe agora como fazer para alijar a carga. Por outro lado, os banqueiros jogam com a crise profunda do próprio capitalismo, a sua alma mãe. Recebem dinheiro a rodos, daqueles que querem fugir à crise e de outros a quem a crise ameaça de perto.

Cultivam o milagre da multiplicação dos pães: os lucros da banca escorrem para os off shores e quando regressam ninguém os reconhece de tão gordos que estão. Se houver défices, eles serão pagos pelos cidadãos comuns. O «País real» é o país dos ricos. A sua religião reside no Vaticano. A sua nação é a Comunidade Europeia. O seu banco, o FMI. Isto, não só em Portugal: também na Europa e em grande parte do mundo. Um exemplo é o da Grécia.

Os «grandes», magnânimos emprestaram dinheiro ao país para qu
e este pudesse recuperar da crise do excesso de consumo. Mas a generosa dívida daí resultante será paga com língua-de-palmo - e será o povo anónimo a pagá-la. O peso da gigantesca grilheta dos encargos servirá também aos banqueiros e políticos para justificarem o carácter de urgência das medidas de «salvação» que reduzam e eliminem o «parasitismo dos trabalhadores», responsável principal, segundo eles, pela eclosão da crise. Nem mesmo num mundo que caminha para o grande deserto, os ricos desarmam. Nunca, aliás, se renderão voluntariamente. A Igreja institucional é um dos mais destacados membros do «clube dos ricos».



Como sempre, Sócrates e os seus, procuram trocar as voltas e baralhar as cartas. Vestem a pele de cordeiro e encostam-se à poderosa igreja romana. Numa época que se diz de penúria, alargam os cordões à bolsa e têm gastos sumptuosos, como os que assumem com a vinda da Ratzinger a Portugal. Convocam os pobres para o beija-mão dos ricos. 
Tentam convencê-los de que tudo o que acontece é inevitável e de que devem baixar os braços. É este o sentido das alianças entre Sócrates e o alto clero. Ou entre Sócrates e a «sociedade civil».



O caos vai-se instalando. Mas as suas leis internas, as suas normas, são bem conhecidas pela Igreja. Por isso, os destinos do capitalismo são indissociáveis dos rumos do Vaticano.

 de Jorge Messias (adaptado)

Enhanced by Zemanta

Sem comentários:

Enviar um comentário