segunda-feira, 23 de novembro de 2009

As formas de ruptura conjugal

Dimmi quando senti il mio silenzio, c’è una po...Image by Ca(non) via Flickr


António Campos

Há diferentes formas de viver a ruptura conjugal - o que ao nível psíquico e individual pode ser considerado "Como um momento emocional, sempre complexo e doloroso, é ao nível sociológico uma realidade vivida em formas muito distintas, distinções estas articuladas a certas regularidades sociais.

Distinguiram-se três grandes grupos de divorciados. No primeiro, que se designou por divórcio-desencontro, incluíram-se os entrevistados que consideravam o divórcio como tendo origem num problema de relação - no seu progressivo esgotamento ou no lento desgaste do vínculo afectivo e amoroso que tinha estado presente no seu início. Aqui, a ruptura conjugal aparece como a afirmação de uma recusa - a de viver sem bem-estar individual e/ou harmonia conjugal - e de uma esperança - a de reencontrar essa felicidade ou esse bem-estar noutro contexto conjugal ou relacional. O divórcio surge como um direito individual a ser accionado (embora como mal necessário) porque é do bem-estar do indivíduo que depende a harmonia do casal e depois da família.

A ausência de responsabilidade, desacompanhamento em relação à família, falta de assistência são algumas das razões dominantes apontadas por um segundo grupo de divorciados para justificar o seu processo de divórcio: o divórcio-culpa do outro. Só que, ao contrário do grupo anterior, são fundamentalmente as mulheres que enunciam este discurso, tenham ou não tomado a iniciativa do divórcio. Os homens acabam por confirmar algumas das práticas de que elas os acusam: menor atenção à família, violência, álcool. O divórcio aparece explicado pelas mulheres pela inadequação dos ex-cônjuges ao papel que deles era esperado, pela sua ausência de sentido de responsabilidade. Os elementos de natureza afectiva não entram como factor explicativo para o fim da relação, a não ser como consequência das características negativas da personalidade do outro.

Fatalidade, destino, amantes - palavras recorrentes nas entrevistas de mulheres separadas que se incluíram num terceiro tipo de divórcio - o divórcio fatalidade. A ruptura conjugal aparece para estas mulheres como algo completamente inesperado, para o qual não pode ser procurada outra explicação pertinente senão a da interferência de algum desígnio do destino. Para os homens esta percepção de "fatalidade" é muito menos acentuada. O divórcio é assim uma "experiência" vivida e sofrida de forma desigual desde o início do processo até às consequências em matéria de recomposição familiar. O contexto social, o sexo, as formas de conjugalidade podem transformar o que uns sofrem como destino em iniciativa libertadora para outros.

Anália Cardoso Torres, "Fatalidade, culpa, desencontro - Formas de ruptura conjugal" in Sociologia - Problemas e Práticas, 1992 (adaptado)

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