quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Portugal um país a dois tempos…

Ponte 25 de Abril. 25th of April Bridge.Image by exfordy via Flickr
António Campos

“Portugal: os Números”, por Maria João Valente Rosa e Paulo Chitas (Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2010), é um alfobre de informação preciosa para se perceber como, em escassas décadas, o nosso País se tornou irreconhecível. O ponto de partida deste livrinho é a Pordata – base de dados de Portugal contemporâneo, banco de informação estatística, acessível a todos através da internet. A intenção dos autores foi a de procurar descortinar, através dos números, tendências globais da sociedade portuguesa, trazer uma interpretação actual do país, articulando o presente ao passado. Escolheram cinco temas: População; Estado Social (no qual se incluem as áreas da educação, conhecimento e cultura, saúde e protecção social); Trabalho e Rendimentos; Justiça; Famílias e Modos de Vida.
Por definição, não se pode dar aqui um retrato da sociedade portuguesa, abrem-se algumas portas para saber quantos somos, por onde anda a nossa qualidade de vida, como trabalhamos, o que podemos esperar da Justiça, como se compõem as nossas famílias, como a habitamos, como consumimos, de que entretenimento e informação passámos todos a dispor.
 
Quantos somos?
A resposta remete-nos obrigatoriamente aos anos 60, época em que se iniciou uma guerra colonial em três frentes, em que houve um colossal surto de emigração, tudo culminou num golpe de Estado, um processo de descolonização, grandes saltos no tecido económico e depois o tudo mais que se sabe desde que chegamos à União Europeia. Se em 1960 rondávamos os 9 milhões de residentes hoje caminhamos para os 11. As mães são menos jovens e com menos filhos. Registou-se uma diminuição impressionante da taxa de mortalidade infantil (em 2008, morriam 3,3 crianças por mil nascimentos, a sexta mais baixa taxa de mortalidade infantil da União Europeia. Para este sucesso contribuiu um conjunto variado de factores desde o aumento de escolaridade, passando pelo saneamento básico até ao programa nacional de vacinação, isto para já não falar na expansão da rede de centros de saúde. O envelhecimento populacional acompanha a escala mundial: o número de pessoas com 65 ou mais anos supera o número daqueles com menos de 15 anos. Dependemos é da imigração já que o nosso saldo natural passou a ser negativo. Para termos gente jovem tornámo-nos um país de acolhimento, do Brasil, passando pelo Paquistão e Índia, até à Europa de Leste.

O que é o modelo social português
A maior fatia da despesa com o orçamento de Estado vai para a educação, a saúde, a segurança e as acções sociais. A despesa em educação pesa cada vez mais, triplicou entre 1972 e 2008; a área da saúde representa actualmente mais do que as despesas com a educação. Tudo mudou com a expansão da rede saúde de cuidados primários, o investimento em saúde materno-infantil, a protecção social, na doença, velhice e invalidez. O sistema escolar deverá certamente ser a rede social mais importante do país; o pré-escolar regista um crescimento notável e o ensino superior tem números impressionantes. Porém os resultados em escolaridade estão muito longe de atingir o que se passa na esmagadora maioria dos outros países europeus. Seja como for, estamos a assistir a uma revolução feminina, veja-se o número de doutoramentos, isto para já não me falar da população diplomada em geral. Investiga-se cada vez mais, tem crescido o número de bolsas, a rede nacional de bibliotecas públicas, o número de museus triplicou entre 1961 e 2008, não tem deixado de evoluir o número de galerias de arte, etc.
A saúde é quase uma “marca de água” do Portugal contemporâneo: pelo crescimento de todos os actos médicos, as consultas em estabelecimentos de saúde, internamentos, urgências, acesso ao medicamento. Ligado a este crescimento temos diferentes factores como o envelhecimento da população, maior nível de instrução, os melhores padrões de higiene, o maior número de profissionais de saúde. A universalização dos direitos sociais é também um facto, cresceu a protecção dos cidadãos face ao não trabalho, a ADSE cobre quase dois milhões de pessoas.

Trabalho e desemprego, salários e rendimentos
O número de pessoas activas tem vindo a aumentar, a larga maioria da população empregada trabalha por conta de outrem, as mulheres têm cada vez mais um lugar importante no conjunto da população activa e cresce o desemprego de média e longa duração. Breve, a população empregada envelhece, feminiza-se, a maioria abandona o sector primário, o desemprego afecta os mais jovens e as mulheres. Se é verdade que há cada vez mais mulheres a trabalhar elas ganham proporcionalmente menos que os homens.
A economia portuguesa, sujeita à abertura ao exterior, passou por fases de rápido crescimento e conhece fases de abrandamento ou mesmo de estagnação, momentos de taxa de inflação elevada ou muito baixa, como aconteceu em 2009. Em 1973, fez-se sentir o choque petrolífero, em 1974, 1975 houve grandes mudanças económicas, em 1978 e 1983 houve necessidade de fazer acordos com o fundo monetário internacional… é um encadeado de vicissitudes que pesam no tipo de empresas, nos sectores de actividades, na capacidade de responder aos desafios da globalização e do desenvolvimento regional.

Mais gente na Justiça, mais demora na Justiça
Há cada vez mais profissionais da Justiça em Portugal (advogados, magistrados, funcionários, PSP, GNR, PJ…), há mais tribunais, menos e mais adequadas prisões, triplicou o número de processos entrados entre os anos 60 e 2008, é notória a falta de capacidade de resposta dos tribunais, é mais elevado do que no passado o número de arguidos, de condenados e de reclusos, uma grande parte dos reclusos portugueses cumpriu ou cumpre pena de prisão por crimes relacionados com o tráfego ou consumo de estupefacientes.

Famílias e modos de vida
 Ninguém desconhece as profundas alterações ocorridas no panorama familiar. Apontam-se razões tais como: quebra dos níveis globais de fecundidade, crescimento das situações de monoparentalidade, diminuição dos níveis de nupcialidade, etc. Há menos casamentos e mais divórcios.
Temos melhores habitações e maiores níveis de consumo. As habitações dispõem de conforto básico, na sua esmagadora maioria. O consumo privado aumentou seis vezes entre 1960 e 2009. É um consumo sempre a aumentar e uma poupança sempre a diminuir.
As actividades de diversão e de informação massificam-se: basta pensar nos espectáculos musicais, de variedades, festivais de todo o tipo. Cresceu o número de periódicos e é impressionante o número de publicações temáticas.
Como escrevem os autores nas notas finais, as mudanças operadas são impressionantes no campo da saúde, da protecção social e da investigação. Os insucessos não podem ser iludidos: insucesso escolar, fraquíssima evolução dos rendimentos reais dos pensionistas com carreiras contributivas mais débeis, justiça morosa. “Apesar disso, o balanço é positivo. Seja pela acelerada quebra da mortalidade infantil, pelos largos ganhos na esperança de vida à nascença, pela integração social das mulheres, pela maior proporção de tempo e de recursos disponíveis para o lazer e para o consumo cultural, pela democratização do ensino ou pelo alargamento da protecção social valeu a pena viver estas cinco décadas em Portugal”.

Ninguém desconhece as profundas alterações ocorridas no panorama familiar. Apontam-se razões tais como: quebra dos níveis globais de fecundidade, crescimento das situações de monoparentalidade, diminuição dos níveis de nupcialidade, etc. Há menos casamentos e mais divórcios. Temos melhores habitações e maiores níveis de consumo. As habitações dispõem de conforto básico, na sua esmagadora maioria. O consumo privado aumentou seis vezes entre 1960 e 2009. É um consumo sempre a aumentar e uma poupança sempre a diminuir. As actividades de diversão e de informação massificam-se: basta pensar nos espectáculos musicais, de variedades, festivais de todo o tipo. Cresceu o número de periódicos e é impressionante o número de publicações temáticas. Como escrevem os autores nas notas finais, as mudanças operadas são impressionantes no campo da saúde, da protecção social e da investigação. Os insucessos não podem ser iludidos: insucesso escolar, fraquíssima evolução dos rendimentos reais dos pensionistas com carreiras contributivas mais débeis, justiça morosa. “Apesar disso, o balanço é positivo. Seja pela acelerada quebra da mortalidade infantil, pelos largos ganhos na esperança de vida à nascença, pela integração social das mulheres, pela maior proporção de tempo e de recursos disponíveis para o lazer e para o consumo cultural, pela democratização do ensino ou pelo alargamento da protecção social valeu a pena viver estas cinco décadas em Portugal”. (....)




Beja Santos (adaptado), Ago23.2010
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