sexta-feira, 12 de março de 2010

A manipulação pela religião

Guadalupe @ Ciudad de MéxicoImage by Gorski via Flickr


António Campos

A religião tem sua base assentada sobre três pilares fundamentais e que se auto-sustentam. Esses pilares chamam-se em grau de importância economia, política e crença. Mas porque a fé estaria em último lugar? Simples: Pegando como exemplo a Igreja Católica, o mais complexo e sólido sistema religioso organizado sob o nome de Catolicismo, antes de tudo, devemos entender que nenhuma religião sobrevive sem dinheiro, vide a Igreja. Ela possui uma complexa rede de seminários, colégios, universidades, santuários, congregações, templos e é claro, sem contar, a magnífica sede do Vaticano. Tudo isso requer custos, entretanto, como muitos se enganam, a fonte de renda da Igreja menos importante são as doações dos fiéis. A prova é tanta que a Igreja Católica aboliu a lei do dízimo o que significa uma auto-suficiência financeira. Diferente de outras igrejas como as protestantes que dependem do dízimo para se manterem funcionando.

Entretanto como vimos a Igreja possui um património tão absurdo que o custo para mantê-los vai além das doações dos fiéis, e nem todo o património que a mesma possui poderia suprir tal necessidade. Desse modo, a principal fonte de renda da Igreja está assentada no seu banco nacional. Fundado no pontificado de Pio XII em 1942, o Banco tinha a função de gerir o então recém fundado Estado do Vaticano, criado mediante um acordo político com o ditador italiano Mussolini. Após um tempo, o Banco passou a ter mais uma função do que guardar os bens do Vaticano. Para ajudar na reconstrução económica da Europa, o banco passou a servir de financiador e até de paraíso fiscal sendo receptor de bens não declarados de grandes empresários da Europa. Muito mais seguro que as Ilhas Cayman, ele cobrava altos juros, garantindo o isolamento económico assegurado pelo património da Igreja, desse modo impedindo um "crack" como aconteceria com o resto do mundo caso houvesse uma crise, pois mesmo sendo nacional, a Economia do Vaticano "não possui" relações económicas oficiais com outras nações.

Desse modo, o primeiro pilar da religião está assente na Economia, uma vez que sem ela os outros dois pilares não podem se sustentar. Sendo independentemente económico, o Estado do Vaticano tem credibilidade no cenário político internacional, uma vez que ele tem autonomia para firmar discretamente acordos com quaisquer países, principalmente na Europa onde a política e a religião estão ligadas à séculos. O secularismo, embora tão defendidos e pregados como uma realidade, na verdade é um engodo, uma bela ilusão, uma vez que justamente por possuir credibilidade na política internacional, o Vaticano pode manipular a política a seu belo prazer como já fazia há anos. O que o Vaticano quer é fiéis, não porque precise para sobreviver economicamente, mas a partir do momento em que a Europa está unida sob uma crença, a ameaça estrangeira, vide actualmente, o Islão, não ameaçaria a estabilidade social. Social, vide económica, pois tudo o que está em jogo são interesses económicos.

Desse modo ao poder interferir na política mundial o contrato torna-se simples. O Vaticano mantém as tradições na Europa segundo os moldes já existentes, afinal a razão da tradição é perpetuar-se pelos séculos, assim o Vaticano financia campanhas de partidos e candidatos conservadores. E desse modo mantendo esses políticos no poder, ela mantém seus costumes na sociedade. O interessante é que justamente depois da criação do Banco do Vaticano, houve uma onda de conservadorismo invadindo os países europeus, e coincidentemente muitos movimentos totalitários e conservadores como o actual presidente italiano, Silvio Berlusconi, um fascista declarado, é amplamente apoiado por membros do clero, vulgo, a Igreja. Mantendo esses políticos no poder, a Igreja mantém essa relação financeira de apoiar certos partidos para que com isso, esses governos eleitos incentivem a aplicação financeira de várias empresas no Banco do Vaticano.

Sobre o último pilar, este é consequência. Na verdade os fiéis interessam principalmente ao Estado. Como cidadãos, o único propósito da Igreja precisar de fiéis é que primeiramente esses fiéis pagam impostos ao Estado, que por sua vez por meio de acordos financiam a sustentabilidade da Igreja. O segundo propósito está em manter a tradição, primeiramente a tradição social, uma vez que esse sistema de contribuição mútua vem desde a época de Constantino onde o Estado garantia a sustentabilidade da Igreja e vice-versa. Assim a função dos fiéis é garantir a perpetuação dessa ordem estabelecida. E voltando à questão do choque cultural, por não querer que essa ordem seja destruída por outra, a unidade de um continente por meio da religião simboliza uma blindagem contra outros sistemas político-religioso como o Islão que cada vez mais ganha espaço na Europa. Desse modo, mais que uma valorização da crença existente, cria-se uma fobia à outra crença/cultura.

Por isso um minarete muçulmano não é o símbolo de uma religião do Médio Oriente e sim o símbolo de um sistema social organizado que possui seus interesses em conflitos com os de outro. Da mesma forma esse conflito expande-se por outras religiões organizadas, seja em âmbito nacional, continental ou global. Com isso cria-se uma perigosa situação onde há uma situação de conflito de natureza económica estabelecida sob uma justificativa religiosa. Por isso foram realizadas as Cruzadas, por isso foi realizada a Intifada, por isso recentemente a população dos EUA defendeu a “guerra contra o terror” sob o pretexto de defesa da soberania do ocidente judaico-cristão. E o pior disso tudo, é que justamente por haver a crença num sistema religioso que os povos são levados a acatarem essas decisões políticas sob nuvens de justificativas religiosas e culturais. Levando em conta que a religião está intimamente ligada à cultura de um povo, ao criar-se um conflito de culturas, o foco desse conflito estabelecido no meio social sempre será voltado primeiramente à crença, com isso, a “ameaça” que a cultura seria atacada por ser considerada fraca pela outra, tornar-se ia na verdade uma “ameaça” onde a crença é que estaria sob o julgamento de ser inferior, ou do Deus dessa crença ser fraco.

Com isso, não é estranho que os homens se matem uns aos outros em nome de Deus, por isso é preciso que o mundo acorde para a realização de um diálogo inter-religioso, e principalmente, que a globalização não se torne um choque de culturas, gerando conflitos muito mais graves, mas uma oportunidade de buscar-se uma trégua nesses conflitos seculares onde os únicos prejudicados são os indivíduos que compõem essas sociedades, só que alienados mediante à fé cega tão pregada semanalmente nos púlpitos dos templos e incentivados pelo culto ao patriotismo e às tradições seculares, faz com que esse ciclo seja indestrutível, e quanto mais ele dura, mais difícil fica de modificá-lo, gerando graves consequências para a evolução social da humanidade.

Posted por Shaka Kama-Hari



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