quarta-feira, 31 de março de 2010

Ciência e Religião

Christian Science CenterImage by Christopher Chan via Flickr


António Campos

Acredito que há um equilíbrio entre os malefícios e os benefícios da religião (nos últimos séculos pendendo para o malefício). Religião não é importante, mas sim a religiosidade inerente a TODAS elas. Religião é pró-forma. Religiosidade é atitude de vida. Um budista não precisa sair por aí de bata laranja para lembrá-lo dos seus deveres enquanto budista. Um crente não precisa esquentar a bíblia debaixo do braço e se envolver em discussões teológicas até para comprar um pãozinho... Eu faço essa distinção, que na minha mente é clara, de que não precisamos de religião (rótulo), e sim de atitudes religiosas (de qualquer religião). Religião escraviza, formata a pessoa num certo dogma. Religiosidade liberta, porque não pode ser confinada a uma religião. Jesus não patenteou o lema "amai-vos uns aos outros", isso está no cerne de várias religiões, e é convenientemente esquecido por todas. A Inquisição NUNCA teria existido se tivesse havido religiosidade na Igreja Católica da Idade das trevas (e penso eu que ela ainda continua saudosista).

"Ciência sem religião é manca. Religião sem ciência é cega." - Albert Einstein

A ciência, quando tomada como religião, é tão ou mais nociva quanto as Religiões "de facto", porque ela primeiramente nem é para ser tomada como Verdade absoluta (tem sempre o "até que se prove o contrário"), mas muitos fazem disso o seu Dogma. Como levar a sério quando os cientistas dizem em um ano: "Café faz mal" e no outro, sob pressão da indústria dos cafeicultores, dizem que "Café faz bem"? Eu li essas notícias... Tudo baseado por amostragens, com 1.000 ou 2.000 pessoas que, se uma delas brochar ou brigar no trânsito, afecta completamente o resultado da pesquisa... Quando leio que "Vinho faz bem" e "Videogame faz mal" fica evidente que há alguma manipulação (não de resultado, mas de abordagem) baseada no preconceito, onde a Ciência não está sendo guiada por cientistas de verdade, da mesma forma que o Cristianismo não está sendo conduzido por cristãos de verdade! Mas não se pode jogar na lata do lixo nem um nem outro... precisamos sim ter discernimento, conhecimento de causa, para ir buscar nós mesmos as respostas para o grande mistério da Vida... Até porque somos parte essencial da resposta.

"A ciência é incapaz de resolver os mistérios finais da natureza, porque nós somos parte da natureza e, portanto, do mistério que tentamos resolver." - Max Planck

"Assim como a religião não conseguiu aniquilar a ciência, a ciência também não poderá aniquilar a religião, pois ambas estão fundamentadas em leis idênticas. Entre elas não existe nem separação, nem contradição. As separações e as contradições existem apenas nas mentes dos ignorantes, que não sabem como Deus criou o universo. A ciência, bem compreendida, só pode ajudar os crentes a concentrarem-se no essencial. Assim como a religião, se bem compreendida, dá à ciência a sua verdadeira dimensão. Cada uma delas tema sua própria função e, desde já, devem coexistir um religioso e um cientista em todo ser humano. Realmente, para que religião e ciência não se combatam mais entre si na sociedade, elas devem parar de se combater no ser humano, pois é exactamente aí que se produzem os maiores desastres. Quando um homem de fé se opõe a um homem da ciência, ou vice-versa, cada um deles pensa que está atacando um adversário externo a ele. Nada disso, está atacando a ele mesmo!" - Omraam Mikhaël Aïvanhov

"A ciência nos afasta de Deus, mas a ciência pura nos aproxima de um Criador." - Albert Einstein

A Ciência cuida do Homem, enquanto a Religião cuida da Alma... Só que não dá para separar a Alma do Homem, e a Filosofia deveria fazer essa ponte de forma "oficial". Só que ela se tornou por demais académica, e Platão é estudado apenas como uma mera curiosidade epistemológica do pensamento humano... Ironicamente Sócrates, o pai da dialéctica, foi alçado à condição de "fundamento da filosofia" e seus estudantes não fazem mais do que balançar a cabeça, em concordância com suas teorias e ensinos. É por isso que gosto de Matrix: pegou a ideia de Sócrates e expandiu-a, revestiu-a de novos conceitos, novos questionamentos, trouxe-a para as massas novamente (como Sócrates gostava de fazer) e nos fez questionar, nem que seja por um segundo: o que é "real"?

"O mundo que habitamos está invertido em relação ao mundo onde a alma se eleva." - Livro dos mistérios cabalísticos

Esse post é resultado direito de um bate-papo mental com meu "EU", que chamo de Grilo Falante. Há meses que não o "acessava", e calhou de ser agora, enquanto preparava meu almoço. Para a ciência médica eu sou um esquizofrénico. Para a psicologia eu acessei meu ID, ou o inconsciente coletivo da humanidade; Para a Teosofia eu acessei meus corpos mais subtis; Para os crentes eu estou endemoniado ou então falei com o espírito santo (a depender do que eles achem da mensagem); Para a filosofia eu falei com um daemon (génio bom), enquanto para o espiritismo posso ter me comunicado telepaticamente com algum espírito... e, no fim, a única coisa concreta é esse post (aliás, nem isso, já que são tudo dados magnéticos)... afinal, o que é "real"?

Retirado de: Saindo da Matrix
http://www.saindodamatrix.com.br/archives/2005/08/ciencia-e-religiao.html
Escrito por Shaka Kama-Hari


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segunda-feira, 29 de março de 2010

A Europa do euro mostra as suas desigualdades

The European Union FlagImage by BlatantNews.com via Flickr


António Campos

A crise na zona do euro mostrou o que vinha sendo encoberto nos anos das vacas gordas: as desigualdades entre as nações que são partes desse território. O euro surge como um passo a mais na direcção da unificação do Mercado Comum Europeu. Deixando de lado as implicações políticas da unificação, que devem ser levadas em consideração em uma região que foi o palco de duas guerras mundiais, o euro surgiu como reforço ao proteccionismo económico, que beneficia principalmente a Alemanha e em seguida a França. Pode ser entendido como um movimento da Europa moderna posicionando-se em relação à globalização, mas também como uma força à integração do mercado mundial. Num momento de dinheiro farto, os países mais periféricos foram favorecidos com um grande aporte de recursos que impulsionou suas economias. Mas, quando a fonte secou, foram os primeiros a sentirem o impacto, pois, já endividados, com o agravamento da crise viram-se obrigados a aumentar a dívida pública sem nenhuma salvaguarda externa.

O endividamento da Grécia, Portugal, Espanha, Itália, Irlanda e dos países do Leste Europeu, que com o espasmo da crise sistémica ameaçam perigosamente ultrapassar ou já ultrapassaram o valor do PIB, têm efeito bem mais perverso do que as dívidas dos países do centro da zona do euro. São parcos os recursos e forças que dispõem para enfrentarem as apostas da especulação financeira. O que é exigido pelos guardiões do euro para reequilibrar as finanças, o rebaixamento salarial e cortes nos benefícios, são medidas que se aplicadas podem ser inviabilizadas politicamente pela esperada resistência dos atingidos.

Fica evidente na ameaça de implosão da dívida “soberana”(1), a distância tecnológica entre alguns países do euro, com impacto na produtividade. Isso se reflecte nas diferenças salariais que apesar de não serem tão grandes quando comparadas com as de países como a China, existem e são significativas quando confrontamos a situação dos salários pagos em Portugal, Grécia, Eslováquia, Eslovénia e mesmo na Espanha, com os da Alemanha e França entre outros. Critica-se a evolução do custo da hora trabalhada na Grécia nos últimos anos, mas esconde-se o fato de que se paga por hora trabalhada neste País quase quatro vezes menos que na Alemanha. O contra-argumento é que a produtividade na Alemanha permite níveis salariais diferenciados.

Daí vem o remédio amargo para a solução das tensões trazidas pela dívida desses Estados: aperto salarial e corte nos benefícios sociais, para que seus produtos com a redução de custos se tornem competitivos enquanto não melhora a produtividade. Mas será possível alcançar níveis de produtividade próximo dos trabalhadores alemães que permitam uma recuperação salarial? Só se o parque industrial e o Governo alemão ficassem parados esperando que os outros o alcançasse. Mas não é essa a lógica entre empresas e países capitalistas. O veneno da competição, entranhado na alma da sociedade da mercadoria, permite a cooperação até certo limite. Quando é possível os mais atrasados aproximarem-se do nível de produtividade dos mais avançados, estes últimos já deram um salto e distanciaram dos parentes mais pobres intensificando o capital constante, mesmo que tenham que dispensar o último trabalhador da produção com as inovações tecnológicas.

Pode-se argumentar que as empresas dos países mais avançados optem em migrar para aqueles que oferecerem salários baixos levando tecnologia e, consequentemente, melhorando a produtividade e salários. De facto isso tem acontecido. Porém, apesar da melhoria da produtividade em alguns ramos industriais, a produtividade geral continua bem abaixo da dos países de onde migraram essas empresas. A China é o exemplo mais contundente dessa realidade. Apesar da transferência de tecnologia com a migração de empresas principalmente do Japão e EUA, só consegue ser competitiva no mercado global pelos baixíssimos salários pagos aos trabalhadores em regime de semi-escravidão e pelo câmbio administrado que mantém o yuan artificialmente desvalorizado. Se partirmos de um ponto zero, a produtividade média do trabalho na China é de 67, Japão 428, EUA 434 e Reino Unido 458*.

Mesmo sendo a China e similares o melhor dos mundos para o capital, onde a mais-valia relativa e absoluta trabalham juntas na acumulação, é impossível por razões diversas a transferência de todo um parque industrial de uma nação para tais oásis do capitalismo, principalmente as empresas de alta tecnologia onde, na contabilidade destas, o trabalho pouco pesa nos custos finais dos produtos se comparado com o capital fixo empregado. O movimento de capitais nos mercados comuns, sempre em busca de maior rentabilidade, pode ter algum êxito como tentativa de defender-se dos outros, mas não de si mesmo: devoram-se do mesmo jeito na briga pela valorização.

*Fontes: Bloom, Mahajan, McKenzie e Roberts (2010)

(1) A bolha estatal na longa jornada da crise

Publicado por Rall

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domingo, 28 de março de 2010

Classe média vai empobrecer

António Campos

Factura. Cortes nas despesas sociais, no rendimento mínimo e nas
pensões são maiores do que nos gastos com projectos e estudos.

As exportações são o motor para a retoma económica até 2013 e o
"ajustamento em baixa dos salários" são a alavanca dos negócios. Não
há dúvidas, Portugal é o país da Zona Euro que menos cresce nos
próximos anos, o que resulta num maior empobrecimento dos cidadãos.
Contudo, e apesar das fracas expectativas de emprego e de salários, o
Governo conta, também, com os gastos das famílias para reanimar a
economia.

No ano passado, as famílias reduziram em 0,8% as compras nas lojas.
Gastaram mais 0,8% em supermercados (alimentos)é certo, mas, em
contrapartida, cortaram 13% nas compras "grandes", como automóveis e
electrodomésticos, em comparação com 2008.
O Governo espera agora, em 2010, que abram os cordões à bolsa e que as
famílias acelerem os gastos em 1% em média anual, até 2013, apesar do
"ajustamento salarial", baixas expectativas de emprego (em 2010 serão
perdidos mais cinco mil postos de trabalho), aumento dos impostos (IRS
- ver caixas) e crescimento dos preços junto do consumidor. Acresce
que o PEC prevê uma expansão em 50% na factura com os juros dos
empréstimos à habitação e um aumento nos preços dos combustíveis.

A chave para o Estado conseguir que as despesas não ultrapassem as
receitas (em impostos e contribuições para a Segurança Social) em 2,8%
do PIB em 2013 também obriga as famílias a poupar.

A Função Pública (com a regra de uma entrada por duas saídas ) perde
quase 50 mil funcionários. Os salários ficam sujeitos "a forte
contenção salarial". Já em 2011, o Governo tenciona poupar 344,5
milhões de euros em salários, tendo em conta um cenário-base
alternativo de aumentos em linha com a inflação (1,9%) prevista (ver
quadro em baixo). Em 2013, a Função Pública - seja por saídas para a
reforma, seja com a "contenção salarial" - perde 1,16 mil milhões de
euros em salários.

O que aí vem para as pensões "não é simpático", como afirma Teixeira
dos Santos, ministro das Finanças, a propósito dos impostos. Os
pensionistas do regime não contributivo, como os pescadores e
agricultores, com pensões no limiar dos 200 euros mensais, não serão
aumentados até 2013. Também os beneficiários do Rendimento Social de
Inserção (RSI) terão cortes. É nesta verba que surgem as maiores
poupanças (de 516,8 milhões de euros em 2011) do lado da despesa.
"Rasgar" compromissos com as concessões rodoviárias vai poupar 447,9
milhões de euros e quase dois mil milhões de euros entre 2012 e 2013.

Do lado da receita, o Estado conseguirá mais 1,1 mil milhões de euros
em 2011. O limite às deduções e benefícios fiscais permite um encaixe
para os cofres fiscais de 447,9 milhões de euros. O corte das deduções
específicas aos reformados dará uma receita extra de 103,4 milhões de
euros. Por fim, as mais valias de acções rendem 241 milhões de euros.

http://dn.sapo.pt/bolsa/interior.aspx?content_id=1520923

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A comunicação social é um trampolim para o poder: Um «saco de gatos» ou os «buracos» de Sócrates

sexta-feira, 26 de março de 2010

A insinuação do real

Real challenge is in the Real world.Image by ~FreeBirD®~ via Flickr


António Campos

Em inícios do século XVII alguns pintores começaram a pintar tabernas. Foi o caso de Miguel Angel de Caravaggio e de Velázquez. Que insolência, que atrevimento, que maneira subversiva de pintar! Começava o ciclo fervoroso de debates sobre a chamada «pintura de género», que designava - por oposição à «pintura histórica», isto é, «importante» - todos os géneros considerados inferiores que tinham por tema as cenas banais da vida quotidiana. Os temas religiosos passaram paulatinamente a ser banidos das telas para darem lugar a incómodos plebeus, como os que frequentavam as tabernas. Não admira que Caravaggio fosse, desde logo, considerado um «Anticristo». As inovações de estilo afrontaram também os pactuados padrões estéticos de beleza. Até então, as cores eram utilizadas para acentuar os volumes corporais. A «iluminação» (o jogo dos claros com os escuros) era convencional, do mesmo modo que os desenhos: puras formas. Caravaggio decidiu transpor para as suas telas a iluminação real: luz de cores, em que um raio iluminava violentamente uma porção de figura, ficando parte dela em negras trevas. Era, pois, uma luz estupefaciente, patética, dramática, mas, acima de tudo, uma luz real.

Foi também com esta luz que, nos seus tempos de juventude, Velázquez começou a pintar tabernas, retratando-as a partir da realidade. O arrojo custou-lhe difamações, descréditos, maledicências. Velázquez passou a ser acusado de «retratista», tomado que era o retrato como uma parapintura de valor estético duvidoso, uma manifestação secundária e residual, em oposição à arte, à verdadeira arte. Até então, as formas «artísticas» sobrepunham-se às formas «naturais» dos objectos, desrealizando-os. As formas «naturais» eram apenas suporte para a realização das formas artísticas através da desrealização do real. O domínio do formal tiranizava e violentava o objecto. Velázquez contribuiu para a recuperação do objecto ante as suas formas. De que modo? Acercando-se - mais do que qualquer outro pintor da época - da realidade(…).

Esta ânsia de acercamento da realidade, de converter o quotidiano em permanente surpresa, insinuando-o através de um naturalismo rebelde - nem sempre bem compreendido e bastas vezes tomado como insolente, atrevido ou subversivo -, é um dos desígnios da sociologia da vida quotidiana. Não é de estranhar que, como Caravaggio e Velázquez, também Simmel tenha sido apodado de «retratista» e ainda hoje continue a ser considerado um «fotógrafo amador» da realidade social,um «hábil em instantâneos» (snapshots) - apodo a que Simmel parece não ter renunciado, pois, justamente, reivindicava esse modo de olhar a realidade.

Para Simmel - esse pintor do social para quem a sociologia era, de resto, uma forma de arte -, o que é típico encontra-se enfatizado no particular; o normal, no acidental; o essencial ou significante, no que parece superficial ou fugaz. As observações fugazes da realidade, que constituem a essência da sociologia simmeliana, transparecem de modo ilustrativo em Snapshots sub specie aeternitatis, título com que Simmel encabeçava as suas contribuições no Jugendstil, periódico alemão que acolhia os seus «instantâneos» sociológicos. Snapshot significa, literalmente, a imagem momentânea de uma cena ou fragmento da realidade. Neste deslizar do olhar pelo social - nos seus aspectos mais particulares, acidentais e superficiais -, o fotografar é um processo de capturar o fugaz que o olhar vagabundo do fotógrafo (ou do sociólogo) possibilita. Assim se entende que Simmel procure preservar nas suas observações da realidade aquilo que nela é único e transitório,ao mesmo tempo que dela extrai o essencial da forma, a tipicidade(…).

Com efeito, Simmel oferece-nos retratos da realidade mas abstraindo-se voluntariamente da totalidade da mesma, de modo que os fragmentos focados pudessem ser mais bem iluminados: como acontecia com Caravaggio, que, ao transpor para as suas telas a iluminação do real, contrapunha a luz das cores às trevas do obscurecido, num movimento oscilante de descobrimento e encobrimento, de revelação e de ocultação(…).Enfim, porque sempre é parcial, não é verdade que o conhecimento arrasta sempre, como a sua sombra, o desconhecido?

A partir desta ambivalência do social, talvez possamos então compreender por que razão a sociologia de Simmel é uma «sociologia do talvez» - tantas são as vezes em que nos seus escritos aparecem expressões equivalentes a «de certo modo», «talvez», «por um lado pode ser>, «mas também pode ser>... É como se Simmel nos dissesse «talvez o céu seja azul» para logo a seguir nos dizer «talvez não seja»... dando-nos maiores possibilidades de imaginar o céu(…). Nesta forma de aproximação ao social, a realidade apenas se insinua, não se entrega. Mas é assim mesmo que, na perspectiva da sociologia do quotidiano, ela tem de ser imaginada, descoberta, construída.

Neste sentido, a sociologia do quotidiano é uma sociologia de protesto contra todas aquelas formas de reificação do social, animadas por uma avassaladora ânsia de possessão. Para a sociologia do quotidiano, o importante é fazer insinuar o social, através de alusões sugestivas ou de insinuações indiciosas, em vez de fabricar a ilusão da sua posse. A posse do real é uma verdadeira impossibilidade e a consciência epistemológica desta impossibilidade é uma condição necessária para entendermos alguma coisa do que se passa no quotidiano.


In, Sociologia da vida Quotidiana, José Machado Pais (adaptado)


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quarta-feira, 24 de março de 2010

Anatomia de um cartel mexicano

Mexico CityImage via Wikipedia


António Campos

No mês passado, o governo mexicano começou a colher os frutos de uma longa investigação coordenada com os Estados Unidos contra o cartel dos irmãos Beltrán Leyva, uma organização criminosa muito sofisticada, diversificada e tecnologicamente avançada. Em apenas três semanas, o chefe da banda, Arthur, o irmão mais velho, foi abatido numa operação da Marinha na semana passada e Charles, o irmão mais novo, foi preso. O outro, Alfredo, está na prisão por dois anos e o quarto, Hector, que é suposto ter assumido o cargo, é um fugitivo.

Golpes espectaculares contra o Beltrán Leyva concentraram-se aos olhos da opinião pública com o seu poder de fogo. Afinal, eles foram os primeiros a recrutar Kaibiles guatemalteco como assassino e o comandante federal comprou, em vez de persegui-lo, como era a sua missão. Também criou uma força enorme de cerca de 300 homens com armas tão poderosas que não existem nos arsenais das forças armadas mexicanas, e desenvolveu um sistema de inteligência que por sua vez lhes permite viver com relativa calma, que facilitou o planeamento para eliminar seus inimigos.

A força e a agressividade do cartel Beltrán Leyva, em esconder a complexa rede ao longo dos anos para construir um negócio de tecidos com ramificações ilegais em 10 estados (províncias) no México, serviu como uma ponte entre as drogas Vale do Norte na Colômbia e os E.U. narcomenudistas da distribuição de Chicago, no coração do Centro-OesteE.U., de milhares de quilos de cocaína e heroína multiplicando o custo inicial de pelo menos 10 vezes.

O Beltran Leyva começou a ser conhecido em 1997, quando a morte do chefe do Cartel de Juárez, Amado Carrillo, o traficante mais importantes de sua época, começou uma guerra por território na fronteira de Ciudad Juárez e El Paso, Texas, para onde cruza 70% da cocaína para os Estados Unidos. O Beltrán Leyva aliou-se com o irmão do falecido líder, Vicente, numa relação que até agora permanece inalterada. Quando foi formada em 2002 a chamada Federation, uma organização de grupos criminosos para enfrentar o cartel do Golfo, Artur Beltran Leyva tornou-se co-diretor do grupo, dividindo o comando com o Joaquin El Chapo Guzman. Seu irmão Alfred foi encarregado da segurança pessoal de todos os chefes da Federação e sua família.

A Federação entrou em colapso em janeiro de 2008, após a prisão de Alfredo Beltran Leyva, e os irmãos enfrentaram seu antigo aliado El Chapo Guzman, que foi acusado de os ter traído. No momento em que a fractura ocorreu, o Beltran Leyva tinha criado um supercartel, onde Hector, que gostava de estar ligado aos meios político e artístico, foi responsável pelas partes mais finas do negócio, a realização de transacções financeiras e de capitais. Parece coincidência que no México, ele é conhecido como o Engenheiro, e nos E.U. como o General.

Hector Beltran Leyva não estava na lista dos mais procurados até 2005, quando as informações prestadas pela DEA, que tinha sido há muito tempo investigando os irmãos, a polícia federal invadiu sua residência num dos mais ricos subúrbios da Cidade do México, onde diversa documentação foi encontrada e levou directamente para o responsável do então presidente Vicente Fox que não conseguiu agir contra ele, porque na época das gravações telefónicas entre ele e Hector Beltran Leyva, que apresentou às autoridades como prova, não foram consideradas legais.

O Beltran Leyva fora crescendo ao mesmo tempo, imitando os passos de Amado Carrillo. Todos nasceram em Sinaloa, um Estado sobre a costa do Pacífico, que é o lar de todos os importantes líderes do tráfico de drogas no México, foram os primeiros a viver no final dos anos 90, como tinha feito Carrillo, o estado de Queretaro, no centro do país. Quando a polícia começou a procurar lá, eles mudaram-se para Morelos, como fez Carrillo, um Estado vizinho à capital federal, Artur Beltran Leyva, onde viveu até sua morte recente.

Amado Carrillo alcançou fama mundial por ter uma grande frota de aeronaves nas quais o tráfico de drogas, que ele ganhou o apelido de "O Senhor dosCéus. O Beltran Leyva criou uma infra-estrutura versátil, com transporte aéreo e terrestre, que incluíram o uso de tractores carregados com medicamentos enviados para E.U. e equipamentos de exportação, importação e exportação das empresas de consultoria de negócios electrónicos, produtos de saúde e serviços hospitalares.

Através deles, foi enviado dinheiro da droga, e o trabalho de Hector Beltran Leyva, foi desenvolver uma espécie de holding em que 22 pessoas ligadas a eles fundaram 10 empresas localizadas nos estados de Baixa California, Chihuahua e Sonora, na fronteira E.U., o estado do México, Jalisco e no Distrito Federal no centro do México e Chiapas, na fronteira com a Guatemala e sua Sinaloa nativa.

A investigação do DEA, a agência anti droga dos E.U. assentou sobretudo em Hector Beltran Leyva, e quase um ano atrás, ofereceu uma recompensa de dois milhões de dólares por informações que levassem à sua prisão. Dos irmãos, é visto como o mais inteligente, enquanto Arthur foi considerado como o mais audacioso e violento. Este foi julgado o ano passado por um júri de Chicago, juntamente com seus parceiros dos E.U.. Além disso, junto com Hector e seus inimigos, agora Guzman e outros líderes do Cartel de Sinaloa, Ignacio Coronel e Ismael Zambada e Jesus, foram acusados num tribunal de Nova York.

A todos eles um júri acusou-os de entrar nos Estados Unidos por terra, ar e mar, submarinos ou lanchas, pouco mais de 254.000 kg de cocaína sul-americana através do México e América Central, e de ter empregado pistoleiros para executar fora "centenas de actos de violência, incluindo assassinato, sequestro, tortura e cobrança violenta de dívidas de drogas", entre 1990 e 2005. Hector Beltran Leyva tem outro cargo similar, desde 2004, em Washington, DC.

No México, o Beltran Leyva levou à guerra múltiplas vezes desde 2008, contra os seus antigos parceiros no Cartel de Sinaloa e contra o governo federal.Na sequência da detenção de Alfred, seu irmão Arthur recuperou a relação dos dirigentes da Federação e suas famílias, muitos deles vivendo em Sinaloa, criando durante a primavera desse ano, uma época de terror com mortes em massa.

Num desafio total, assassinou o ex-responsável pela luta contra a droga, José Luis Santiago Vasconcelos, que morreu num acidente de avião em Novembro de 2008 - com uma bazuca que foi desferido como planeado, teria explodido uma dúzia metros para o seu veículo e tinha uma arma de nível 5. O Beltran Leyva terá matado dois comandantes da polícia , além de ter planeado um atentado contra o secretário de Segurança Pública Federal, Genaro García Luna.

Hoje eles estão desmembrados, mas o conflito não terminou. São meses de investigação e contínuos golpes das suas estruturas operacionais, redes de distribuição, mecanismos de financiamento e sistemas de segurança. Em pouco mais de dois anos, o governo mexicano fez um caminho semelhante ao Cartel do Golfo, cujo braço armado é o Zetas, e praticamente desmanteladas. Nunca se conseguiu dar o golpe de misericórdia e essa quadrilha foi reconstituída e agora está operando em alta capacidade. A mesma situação existe sobre o cartel Beltrán Leyva, e na mesma situação está o governo mexicano. Se tentar rapidamente liquidá-los, o bando renasce com a mesma força, algo que nem os E.U. nem o governo mexicano querem que aconteça.

Raymundo Riva Palacio

Traduzido do espanhol

© EDIÇÕES EL PAÍS SL - Miguel Yuste 40 a 28.037 Madrid[Espanha]



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terça-feira, 23 de março de 2010

Estado pagou menos 100 milhões de euros em pensões de invalidez no ano passado

Os serviços da Segurança Social gastaram 1319,2 milhões de euros em
2009 nos cerca de 300 mil beneficiários de pensões de invalidez. Este
montante representa uma quebra de mais de 100 milhões de euros em
relação à estimativa de execução inscrita na proposta de Orçamento do
Estado (OE) para 2010, que apontava para um encargo de 1421,2 milhões
de euros no final de 2009.

Os dados disponibilizados pelo Ministério do Trabalho e da
Solidariedade Social revelam que os gastos do Estado com esta
prestação social registaram uma descida de 800 mil euros em relação
aos encargos registados no final de 2008, os quais atingiram os 1320
milhões de euros.

Esta quebra é justificada pela redução do número de beneficiários com
esta pensão. No final do ano passado, o número de pensionistas activos
de invalidez foi de 298.798, o que traduz uma descida de 5029 face aos
pensionistas registados no final do ano anterior.

O PÚBLICO tentou obter uma explicação para esta quebra junto do
Ministério liderado por Helena André, mas tal revelou-se impossível
até à hora de fecho desta edição.

Os dados do Ministério revelam que o número de beneficiários desta
prestação continua a ser repartido entre os dois sexos, com uma
ligeira vantagem dos homens (149.811 contra 148.973 mulheres). A
análise pelos vários regimes desta prestação permite concluir que a
maior redução ocorreu com a pensão do regime geral, a que mais pessoas
abrange. O número de pensionistas no final de 2009 era de 241.881,
menos 4944 do que em 2008. Já a pensão do regime de pensão social, a
segunda que mais beneficiários abrange na pensão de invalidez, foi a
única que registou uma subida (mais 732) do número de pensionistas,
que agora totalizam os 48.193. O número de pensionistas dos regimes
regulamentar rural e rural transitório diminuíram, respectivamente,
para 7500 e 1210 beneficiários.

Por regiões, os dados indicam que entre os cinco centros distritais
com mais pensionistas activos só o de Braga - o terceiro com mais
beneficiários - registou um aumento, ainda que ligeiro, do número de
beneficiários, para 26.603. Em Lisboa, caiu para 51.058; no Porto
desceu para 48.826; em Setúbal para quase 22 mil; e em Aveiro para
18.883.

Há duas semanas, o CDS apresentou uma proposta no Parlamento tendo em
vista o aumento do valor da pensão social por invalidez acumulado com
rendimentos do trabalho. A pensão social por invalidez é atribuída a
cidadãos que não auferirem rendimentos de qualquer natureza ou não
excedam 30 por cento do salário mínimo (ou 50 por cento dessa
remuneração, tratando-se de um casal). Ou seja, um cidadão só poderá
acumular esta pensão social com rendimentos de trabalho até um limite
de 315,30 euros.

http://economia.publico.pt/Noticia/estado-pagou-menos-100-milhoes-de-euros-em...

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segunda-feira, 22 de março de 2010

Medidas para garantir a sustentabilidade das pensões e da recuperação económica

Récupération des fruits et légumes jetés en fi...Image by gelinh via Flickr


António Campos

A crise actual está sendo usada pelos liberais para conseguir, o que eles não poderiam conseguir em todos estes anos, ou seja, a redução dos direitos sociais, e de trabalho, das classes política e popular. Relatório após relatório (financiado por bancos, caixas económicas, as companhias de seguros e das associações empresariais) aparecem quase que diariamente, a pressionar os governos a tomar medidas impopulares, como a redução das pensões e dos salários dos trabalhadores. Nesta enorme avalanche liberal, os media persuadem para promover a divulgação mais ampla (que prevê enormes caixas de som), alegando a não viabilidade das pensões públicas, como resultado da transição demográfica. Ressalta-se novamente que o crescimento da população idosa torna economicamente inviável o sistema público de pensões. Em vários artigos tenho criticado este determinismo demográfico, documentar os erros e manipulações que aparecem com frequência nesse tipo de argumentos ( "Os erros do determinismo demográfico: o caso das pensões", sistema digital, 05.02.10).

A frequência e a intensidade desta explicação, que atribui a crise e insustentabilidade dos sistemas de pensões, o factor demográfico está sendo utilizado para ocultar a verdadeira causa do problema da sustentabilidade dos sistemas de protecção social é a grande polarização dos rendimentos, causadas precisamente pelas políticas liberais realizada em ambos os lados do Atlântico, na maioria dos países da OCDE.

O elevado crescimento da produtividade que tem ocorrido na maioria dos países da OCDE, nos últimos trinta anos não foi acompanhado pelo crescimento dos salários e vencimentos. Na verdade, este último, como uma percentagem do rendimento nacional diminuiu como resultado da implementação dessas políticas neoliberais. Este declínio no rendimento do trabalho tem sido acompanhado por um aumento muito substancial das receitas de capital. País após país, os lucros das empresas têm aumentado substancialmente (ver meu artigo "Então, tudo começou em os E.U.", Le Monde Diplomatique, Junho de 2009). Contribuições para a Segurança Social, no entanto, decorrem principalmente do rendimento do trabalho, em vez de ganhos de capital. As evidências mostram claramente que a contribuição para a Segurança Social é feito à custa dos salários reais dos trabalhadores. Uma consequência desta descida do salário foi, portanto, uma diminuição do montante da contribuição à Previdência Social pelo trabalho. Este facto, que ninguém fala, está bem documentada no artigo de Christian E. Weller, "O futuro das pensões públicas no âmbito da OCDE", publicado em Cambridge Journal of Economics (2004, 28.4895-504). É uma vergonha que este artigo não inclua a Espanha (incluindo França, Alemanha, Itália, Japão, Suécia, Grã-Bretanha e E.U.A.). Mas em Espanha também vemos um declínio no rendimento do trabalho como uma percentagem do rendimento nacional. De 1980 a 2010 a renda do trabalho como uma percentagem do rendimento nacional caiu de 65% para 57% e em Espanha, 66,8% para 56,6%.

Uma das conclusões do estudo pelo professor Weller é uma medida importante para melhorar a sustentabilidade dos sistemas de pensões não é apenas aumentar a produtividade, o que é extremamente importante, mas também os salários, assegurando que a produtividade aumentou causando um aumento dos salários e rendimentos à Segurança Social (ver meu artigo "Os salários em Espanha", Público, 04.03.10). Como bem disse Weller, o futuro das pensões depende em parte a quantidade de bons empregos que existem num país e da distribuição do rendimento entre trabalho e capital. O crescimento do emprego, crescimento dos salários e diminuição da desigualdade (maior proporção do rendimento nacional, do rendimento do trabalho e menor a proporção do capital) é muito importante para garantir o futuro das pensões.

E uma outra dimensão também que Weller aponta e de enorme importância para o futuro das pensões é a entrada das mulheres no mercado de trabalho, para aumentar a percentagem da população adulta. No entanto, esta medida requer um investimento para facilitar a integração das mulheres no local de trabalho para aumentar a base de que uma vez chamou o pilar 4 de bem-estar (ver meu artigo "O quarto pilar do Estado Social," Público 15/10 .09), que deve incluir não só os serviços de dependência, mas também as crianças na escola (erroneamente chamado de viveiros em Espanha, o que implica que eles são os depósitos para crianças). A entrada das mulheres no mercado de trabalho cria, por sua vez, a procura de emprego, especialmente nos serviços de cuidados pessoais em casa, que se fez antes com a mulher em casa. E, naturalmente, esta integração das mulheres exige uma mudança de valores humanos, ao assumir a responsabilidade conjunta das responsabilidades familiares. Estas são medidas que não são visíveis no debate sobre a sustentabilidade das pensões e que, ao contrário, são fundamentais para seu futuro.

Uma observação final,sobre as propostas de redução dos salários, o empregador está fazendo e, indirectamente, o PP e o catalão direita, é suicida. Esta proposta, juntamente com o objectivo de reduzir a despesa pública é extremamente negativa, porque as provas e consistentemente negligenciado nos meios de comunicação espanhóis de maior circulação, indica claramente que a principal causa da desaceleração do estímulo económico é a baixa procura. Por conseguinte, deve ser dado o crescimento dessa procura, que é realizado principalmente por um aumento na cobertura do seguro de desemprego (trabalhadores desempregados consumir tudo o que recebem), os salários aumentaram e o aumento do emprego baseada no investimento e na criação de emprego. Curiosamente, o debate existente no seio da União Europeia, que o ministro da Economia do governo Sarkozy, Christine Lagarde, é criticado, justamente, pela a Alemanha pelas políticas de austeridade (com pouco crescimento dos salários) não permitem mais estímulo económico da Alemanha e da União Europeia. Aquelas vozes que insistem em austeridade, estão jogando com a ideologia liberal que só nos levaram à crise actual. E agora eles estão prejudicando a economia espanhola, dificultando a sua recuperação.

A este respeito, eu recomendo o artigo de George Irvin, publicado no The Guardian (14.03.10), que indica que o estímulo que se está tentando dar à economia europeia baseada no aumento das exportações, tem o grande problema que, para alguém ter de fazer importação e exportação, que é difícil de ocorrer se o poder aquisitivo da população está sendo reduzida com a UE a reduzir os salários e gastos públicos. Em uma economia integrada, como a economia europeia para tentar recuperar a base de exportação é profundamente errado, porque, na ausência de um aumento do consumo interno e uma procura em toda a Europa, não haverá uma recuperação robusta. Na verdade, a principal causa da não recuperação económica dos países mais pobres da UE é precisamente a política de austeridade que está sendo seguida. A Alemanha, o motor da economia europeia, que vai puxar o resto da UE, tem que aumentar o seu próprio consumo interno. Isto é o que está acontecendo, na China, cuja liderança se deu conta de que a política de recuperação económica com base nas exportações não é suficiente, necessitando de um forte aumento do consumo público, que é necessário para a redistribuição recursos (orientados para o aumento do consumo das massas) e um aumento nos gastos públicos. Uma questão fundamental é que o crescimento dos salários e um aumento da população ocupada, por meio de políticas de pleno emprego, as mesmas políticas, naturalmente, serão necessárias para assegurar que o sistema público de pensões funcione.

Vicenç Navarro

Traduzido do espanhol.

http://www.rebelion.org/noticia.php?id=102667



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sexta-feira, 19 de março de 2010

A reforma como componente social da velhice

vintage shot of old peopleImage by freeparking via Flickr


António Campos

O surgimento dos sistemas de reforma ocasionou uma situação relativamente nova: a condição de reformado. Anne-Marie Guillemard atribui à reforma uma dupla significação. Por um lado, representa o afastamento do circuito de produção em que o indivíduo estava envolvido. Por outro lado, tal afastamento oferece a contra partida do direito a um repouso remunerado, ou peja, ao mesmo tempo "que a reforma assegurava certa garantia contra a miséria ela institucionalizava a perda de capacidade dos velhos trabalhadores e a sua desvalorização".

Estudar os processos de constituição dos sistemas de reforma consiste assim em analisar as implicações da gestão, por instâncias criadas para o efeito, da passagem da situação activa de trabalho à situação de não trabalho. Ainda segundo a mesma autora, passagem à reforma, corresponde ao momento mais importante da reestruturação dos papéis sociais. A vida roda em tomo de dois mundos, o familiar e o de trabalho, nos quais se desenrolam os principais desempenhos. Ao deixar o primeiro, só o segundo pode assegurar o equilíbrio social e pessoal. O afastamento da actividade laboral representa uma perda relativamente a um desempenho profissional e às relações daí decorrentes. Os papéis sociais dentro da vida familiar adquirem, por isso, outra importância num contexto de reforma.

A situação de reforma promove ou uma acentuação das relações familiares ou o isolamento. Esta perspectiva é considerada positiva face ao papel desempenhado pela família e opõe-se à tese desenvolvida por Parsons segundo a qual a transformação do papel do idoso na sociedade industrial afecta a posição deste dentro da família. Com efeito, a industrialização desintegrou a família patriarcal fundada num sistema vertical. A família ficou reduzida à unidade conjugal cuja constituição implicou ruptura com a família de origem. A reforma é a componente eminentemente social da unidade aparente que constitui a noção de pessoa idosa. Do outro lado o envelhecimento, ou velhice, que constitui o elemento biológico.

Operacionalizada a velhice desta forma é possível analisar o problema a partir da sua componente social, a reforma, que Anne-Marie Guillemard define a partir da oposição trabalho/não trabalho. O trabalho está no centro da definição da posição do actor na estrutura social. O não trabalho representa a exclusão do circuito de actividade e o actor social reformado afirma-se pela sua capacidade de trabalho realizado, isto é, pelo tipo e importância dos recursos acumulados que constituirão as condições sociais determinantes das diferentes condutas(…).

A partir desta investigação, a autora chegou à classificação de cinco tipos de práticas sociais sobre a velhice, em que cada uma representa um conjunto particular de orientações sociais. São elas a reforma-reforma, a reforma terceira idade, a reforma lazer, a reforma reivindicação e a reforma participação. A primeira é caracterizada por orientações essencialmente naturais ao contrário das duas seguintes com cariz mais social. As duas últimas, reforma reivindicação e reforma participação, referem-se à definição social da velhice, a forma como está socialmente instituída e a forma como é assumida, rejeitada ou aceite.

Em investigação realizada posteriormente, Anne-Marie Guillemard e Remi Lenoir analisam ainda as formas de sociabilidade que se estabelecem em situação de reforma. Esta investigação é sequência da anterior; acima referida, sobre as práticas sociais em situação de reforma, mas, neste caso, ao contrário do anterior, em que se procuravam identificar as condutas face aos processos que constituem e transformam a sociedade, consideram-se as condutas como respostas a situações dadas, socialmente definidas e que são as situações de velho e reformado. Em ambos os casos as práticas sociais e a sociabilidade foram explicadas pelo nível e a natureza dos recursos acumulados durante a vida de trabalho.

Para os mesmos autores, o pressuposto é de que a vida de trabalho e a vida familiar são igualmente geradoras de relações sociais. O trabalho não é somente uma actividade produtora de bens e serviços, ele proporciona o estabelecimento de trocas sociais que podem ir até a uma certa solidariedade. Corresponde a uma situação social que é simultaneamente um lugar de encontro, um tempo passado em conjunto e uma actividade comum. A vida familiar engendra também relações sociais porque envolve um mesmo espaço, uma parte da vida passada em conjunto e uma grande variedade de actividades vividas e partilhadas com os outros membros da família. Porém, as relações familiares parecem ser mais fortes e persistentes, uma vez que resistem melhor ao tempo e às provações, para além de envolverem alguma obrigatoriedade.

No centro dos factores que engendram a sociabilidade está a posse de capital e portanto as formas de ter e as aptidões que promovem, ainda que apenas as formas de capital sejam insuficientes para explicar o conteúdo e a coesão do sistema de trocas. Daí que o essencial não é tão-só a posição que o reformado ocupou no mercado de trabalho - factor determinante das práticas sociais -, mas o lugar que ocupa nos diferentes sistemas de agentes, estando em situação privilegiada o sistema familiar. Esta relação com a família é dependente ou dominante consoante as posições relativas que ocupam pais e filhos no sistema familiar. A velhice, para estes autores, representa "a etapa da vida na qual o volume e o conteúdo das trocas são directamente função do tipo de laços levados a cabo coma família e em particular com os filhos"(…).

Pode-se então afirmar que se é sociologicamente velho "quando se tem a sua sociabilidade inteiramente dominada pelo jogo das relações sociais que unem entre si os membros da sua família". Se a velhice pode ser definida sociologicamente como a idade de maior vulnerabilidade às relações sociais estabelecidas com a faml1ia, ela pode também ser considerada como o momento em que se acentua o jogo cumulativo dos determinismos sociais e onde se cruzam as desigualdades iniciais.

In Velhice e Sociedade, de Ana Alexandra Fernandes (adaptado)

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quarta-feira, 17 de março de 2010

A Grécia arruinou-se ou foi conduzida à falência...

Manif anti-crise @ MontpellierImage by raguy via Flickr


António Campos

Enquanto os discursos dominantes atribuem a situação económica crítica da Grécia a uma má gestão camuflada por aldrabices das contas públicas, Karl Müller analisa-a como a consequência de políticas externas ao país. Classicamente, põe em causa o papel das agências de classificação para favorecer a especulação. Sobretudo, e isto é muito pouco conhecido, põe em causa a política económica agressiva de Berlim que enriqueceu a Alemanha em detrimento dos seus parceiros mais pequenos da zona euro.
Atenas, princípio de Fevereiro de 2010. Por toda a parte, nesta cidade de mais de 3 milhões de habitantes que explode literalmente, encontram-se pessoas amáveis, abertas, comunicativas e trabalhadoras. Serão elas responsáveis pelo facto de a União Europeia condenar o seu país ao pelourinho? E será culpa delas que desde há algumas semanas ou seu país seja manchete nos jornais de uma forma tão negativa? Ou será que os verdadeiros responsáveis encontram-se algures?

Quem são estas famosas "agências de classificação"

Dia 11 de Fevereiro, o presidente do grupo socialista do Parlamento Europeu, Martin Schulz, no decorrer de uma entrevista à Deutsch-landfun declarou: "Mencionaram as agências de classificação que, parece, baixaram a classificação de solvabilidade da Grécia. Gostaria de falar esta manhã com os chefes de Estado e de governo [eles estavam reunidos a 11 de Fevereiro para falar da crise financeira da Grécia] a fim de saber quem são estas agências de classificação e que interesse têm elas em declarar que as medidas são ineficazes, que é preciso aumentar taxas de juro dos empréstimos que serão concedidos a qualquer momento quer por países quer por bancos privados. Alguém vai receber estes juros, mas quem? Quem tem interesse em que se aumentem as taxas? As agências de classificação. Mas quem são elas? Esta é uma das pequenas questões que apresento de passagem pois nunca são debatidas".

A culpa cabe aos especuladores monetários?

Rudolf Hickel, especialista de esquerda em questões financeiras, exprimiu os seus temores ao declarar em 11 de Fevereiro ao Spiegel Online: "Uma falência da Grécia poderia causar a ruína de todo o sistema do euro". Segundo os media alemães, toda a agitação a propósito da Grécia foi provocada voluntariamente por aqueles que especulam com as moedas, "pois os beneficiários de uma eventual falência do Estado são sobretudo aqueles que especulam em Bolsa com as moedas". Segundo Hickel, "quanto mais pequeno for o país, mais ele é entregue brutalmente aos especuladores. [...] Após a Grécia, a Espanha e a Itália estarão na linha de alvo dos especuladores".

O capital financeiro age ao seu bel-prazer

Para o chefe dos socialistas europeus, trata-se de um dilema: por um lado eles aferram-se com todas as suas forças à UE e ao euro para os seus projectos de governo mundial. Por outro lado, o capital financeiro — os responsáveis socialistas estão sempre ao seu serviço — age ao seu bel-prazer e nunca se sabe com certeza a favor de quem ou contra quem ele se decide neste ou naquele caso. Actualmente, não apenas para com o euro, mas sobretudo em relação ao dólar? Diz-se que os Estados Unidos, este ano, vão lançar 2,5 mil milhões de empréstimos públicos. É muitíssimo dinheiro e a concorrência aumenta nos mercados financeiros. Em todo o caso, isso dá uma chicotada nos negócios. Hickel diz simplesmente: "Os especuladores não visam um curso particular do euro que reflectisse adequadamente a actividade económica. Eles sacam muito mais lucros com um curso extremamente instável". Segundo o Neue Zürcher Zeitung de 11 de Fevereiro, a bolsa de futuro de Chicago, que é determinante para o negócio dos derivados monetários, actualmente aposta mais do que nunca contra o euro.

Faz-se negócios com os juros

Também se fazem negócios com os juros. Só em Abril e Maio de 2010, empréstimos do Estado grego num montante de cerca de 40 mil milhões chegando à maturação deverão ser reembolsados por meio de novos empréstimos, novos créditos, contudo não mais a 3% e sim a cerca de 6%. Os prestamistas chamam a isso "prémio de risco" por causa da dívida pública grega. Na realidade, eles assim duplicam os seus lucros pois até aqui a Grécia sempre pagou. Parece que este ano, um total de 2,2 mil milhões de empréstimos públicos chegam à maturação na zona euro. Uma grande parte deverá ser financiada recorrendo aos mercados financeiros. E se o mundo das finanças conseguisse também aqui — em Portugal, na Itália e na Espanha e igualmente em França e na Bélgica, talvez mesmo na Alemanha — fazer escalar as taxas de juro com a ajuda das agências de classificação? Um por cento a mais representa 22 mil milhões de euros. Isto seria um negócio formidável... em todo o caso durante tanto tempo quanto os povos e os Estados participarem neste jogo sinistro. E o que aconteceria se o euro não pudesse mais ser sustentado, se a UE afundasse e se por exemplo a Grécia não reembolsasse mais as suas dívidas senão em condições justas?

A Alemanha lucrou com o euro... em detrimento de outros países

Antes de mais nada, a Alemanha perderia enormemente o seu poder. Até agora a sua indústria exportadora, em particular, lucrou consideravelmente com a UE e a introdução do euro. Actualmente, as exportações representam cerca de 50% do PIB.
O jornal Junge Welt titulava em 9 de Fevereiro: "Falência made in Germany. A ameaça do afundamento das finanças públicas de Estados da Europa do Sul é a consequência directa da política agressiva da Alemanha em matéria de comércio exterior". No artigo podia-se ler: "Desde há décadas, Berlim conduz uma política económica agressiva fundamentada nas exportações. [...] A maior saída para o capital alemão é a UE. [...] A moeda comum europeia privou os países da zona euro expostos a esta ofensiva exportadora alemã da possibilidade de restabelecer a competitividade das suas economias procedendo a desvalorizações da sua moeda. O enorme desequilíbrio económico que daí resulta manifesta-se de maneira flagrante através da Grécia, esta candidata à falência que, em 2008, importou mercadorias alemãs no valor de 8,3 mil milhões de euros ao passo que as suas exportações chegavam apenas a 1,9 mil milhões de euros.
Para o autor do artigo, uma causa importante do "êxito" alemão reside numa "estratégia de empobrecimento do mercado interno: Entre 2002 e 2008, os salários brutos aumentaram em média 15,2% na Alemanha, mas 31,9% no conjunto dos países da UE".

O euro conduz a um controle total dos Estados da UE

A grande indústria alemã tem "necessidade" de países como a Grécia, mas a longo prazo isto não funciona senão se a política alemã puder controlar cada vez mais estes países. E é para isso que serve a actual política da cenoura e do bastão: o bastão das restrições para a população, do controle por comissários europeus para o governo. O novo presidente da UE, Hermann van Rompuy, declarou após a cimeira de Bruxelas: "Pedimos ao governo grego para aplicar todas as medidas de maneira rigorosa e determinada". Mas a cenoura foi igualmente apresentada aquando da reunião de 11 de Fevereiro dos chefes de Estado e de governo: "Não abandonaremos a Grécia", declarou a chanceler alemã Angela Merkel (comunicado oficial).
Isto quer dizer que a Alemanha faz saber que em caso de insolvência da Grécia, ela está pronta a ajudar financeiramente... a fim de sustentar o euro e não, sem dúvida, por solidariedade.
E qual é o preço? A inflação? Ainda mais sacrifícios para o contribuinte alemão e sobretudo em detrimento dos trabalhadores? Daniel Gros, director do Centro for European Policy Studies (CEPS) de Bruxelas, informou à revista alemã Manager Magazin em que consistia o "controle da crise" em países como a Grécia: "Trata-se precisamente de baixa dos salários no sector privado. Para mim é o essencial". E ele não pensava apenas na Grécia.
Os líderes socialistas europeus louvarão isto como um acto de solidariedade. Os chefes de governo socialistas dos Estados europeus, na véspera do encontro dos chefes de Estado e de governo, haviam pedido uma "ajuda" urgente para a Grécia (e os outros países do Sul da Europa que eram postos em causa pelos jornais). Observemos bem realmente: os socialistas europeus também querem a UE e o euro.

O governo alemão aspira a um estatuto de potência mundial?

Retornemos mais uma vez à Alemanha. A agência de informação privada estado-unidense Stratfor Global Intelligence publicou a 8 de Fevereiro uma análise interessante sobre o papel da Alemanha na Europa e no mundo ( "Germany’s Choice" ). Durante décadas a Alemanha foi o tesoureiro da Europa sem desfrutar de um peso político real, mas agora ela não é mais um "observador passivo" munido de um livro de cheques". Merkel é a primeira chanceler que governa "liberta do peso dos pecados passados". Ela já não está disposta a pagar pela Europa "em detrimento dos interesses alemães".
Mas ela pagará apesar disso, ou antes, por causa disso, no caso da Grécia. Seria certamente "inteligente" que a Alemanha cessasse de pagar e que a UE e o euro se afundassem, mas sem a UE e o euro a Alemanha não poderia mais pretender o estatuto de potência mundial. (Na verdade, para a população pouco importa.) Contudo, o governo Merkel importa-se e o preço que os outros Estados da UE devem pagar para isso é o controle absoluto da Alemanha sobre o Banco Central Europeu e por isso mesmo sobre os orçamentos de todos os países da zona euro.
Mas não vemos perfilar-se aqui uma megalomania que já se manifestara outrora na Alemanha? O que é que torna o governo alemão tão certo de que não poderá encontrar-se em breve à beira da falência? Ou existem planos sinistros da direita e dos Verdes tendo em vista uma renovação "alemã verde" que não recua diante de nada?
Mas retornemos à Grécia. Aquando das manifestações contra o plano de rigor imposto pela UE ao novo governo, podiam-se ler ou ouvir slogans como "Não aceitaremos o desemprego e a pobreza para permitir ao capital monopolista que faça grandes lucros" ou "Não pagaremos nem um cêntimo à plutocracia". O secretário-geral do sindicato grego dos funcionários Adedy declarou: "Eles prometeram que os ricos pagariam mais ao invés disso eles se servem dos pobres. É esta política que combatemos, não a tentativa de ultrapassar a crise".

Os gregos estão fartos da UE

Tem a Grécia alguma possibilidade de se safar no seio da UE e da zona euro? Dificilmente! Um artigo publicado no Neue Zürcher Zeitung de 12 de Fevereiro intitulado "A zona euro, zona de conflitos" recordou mais uma vez uma falha fundamental do euro: Contra toda a razão económica, a introdução do euro devia permitir criar um super Estado europeu. Mas isto era quimérico desde o princípio: "As tensões no seio da união monetária europeia são mais ou menos o resultado do facto de que os políticos sempre viram na união monetária um instrumento destinado a acelerar e a impor a integração política da Europa. Faz-se uma utilização abusiva da instituição monetária a fim de visar objectivos situados para além da política monetária, o que representa um perigo para a estabilidade da moeda e para a economia".
É possível que se a Grécia saísse da UE sofresse num primeiro momento um certo número de inconvenientes económicos e outros — mas se ela permanecer na UE, os inconvenientes multiplicar-se-ão consideravelmente. Os atenienses dizem que estão fartos da UE e é normal. Não confiar senão nas suas próprias forças e desfrutar da liberdade é mais digno do que levar cada vez mais uma vida de escravos.

Karl Müller

http://www.voltairenet.org/article164340.html





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segunda-feira, 15 de março de 2010

My First Blog Post

de AntónioCampos

Eleições francesas: a vitória da esquerda, derrotando o centro-direita
Nicolas Sarkozy ...

A derrota para a direita francesa
A primeira volta das eleições regionais teve um perdedor
inquestionável, o presidente Nicolas Sarkozy, ao ponto de falar sobre
o fim do sarkozysmo, e um vencedor, o Partido Socialista e a esquerda.

A esquerda francesa renasceu das cinzas depois de vários anos no
cadafalso, enquanto a direita no poder e do sistema democrático
recebeu uma sonora bofetada. A primeira volta das eleições regionais
de domingo teve dois perdedores, o presidente Nicolas Sarkozy e da
representação democrática, e um vencedor inquestionável, o Partido
Socialista e os membros da esquerda. Com mais de 53 por cento de
abstenção, esta quebra o recorde de consulta absenteísmo eleitoral
restaurada, enquanto os socialistas na dinâmica do poder. O PS
fortemente dominado a UMP partido presidencial, com cerca de 30 por
cento, para pouco mais de 26 por cento para o partido de Sarkozy.
Polls previsões foram cumpridas quase ao pé da letra, mas com a
excepção da extrema-direita Frente Nacional. O partido de Jean Marie
Le Pen, novamente a aumentar com seu desempenho histórico e reforçado
neste domingo um pouco mais de 12 por cento dos votos quando as
pesquisas terem estabelecido um limite de 10 por cento. Os outros dois
ganhadores são os ambientalistas ea Frente de Esquerda.
Europa Ecology Movement, liderado pelo ex-líder das revoltas
estudantis de maio de 68, Daniel Cohn-Bendit, foi um por cento pouco
mais de 12 dos votos, enquanto a Frente de Esquerda lista dos
socialistas e outros dissidentes correntes do gauche francês situa-se
em um espectro que varia entre 8 a 11 por cento de acordo com
pesquisas.
Para os socialistas eo seu primeiro-secretário, o ex-ministro do
Trabalho, Martine Aubry, os resultados são uma ressurreição de
sucesso. Nove meses após a humilhação sofrida nas eleições europeias
(16,48 por cento), o PS voltou ao pelotão da frente e torna-se
eleições para se tornar a primeira parte da França, à frente da
máquina eleitoral desenhado pelo presidente francês.
Sarkozy perdeu ontem em três vertentes: a sua política e seu estilo,
sua estratégia foi a de fagocitose partido para as outras partes do
direito de absorvê-los em-um que o priva de um bloco de voto para o
segundo turno 21 de março, ea homenagem dos seus flertes com a
extrema-direita através de um raro debate sobre a identidade nacional,
teve de responder à pergunta "O que é ser francês?" - promovido pelo
ministro da não menos extraordinária Imigração e Identidade Nacional,
o ex-Socialista Eric Besson. Listas da UMP caiu cores por toda parte.
Unidade Sarkozy havia desenvolvido um modelo chamado "Cannonball"
copiou o contorno da corrida presidencial de 2007, com o objetivo de
obter 30 por cento no primeiro turno e remobilizar direita no segundo.
A idéia caiu no vazio. Pior ainda, 12 por cento da extrema-direita
podem ficar neste jogo e com ele os duelos segundo triangular que fará
com que direito adversas.
A esquerda é dirigida para segundo turno com sólidas perspectivas de
preservar a 24 das 26 regiões que controla e pode mesmo ter recursos
para manter mais um. Martine Aubry partido tem um backup consistente
de votos graças às percentagens dos seus aliados naturais, ecologia e
Europa a Frente de Esquerda. No entanto, a taxa de abstenção suspende
um mistério que os analistas e pesquisadores não conseguiram
definir.Para alguns, a abstinência é devido à desmobilização do
eleitorado à direita e cívica despertar da esquerda.Outros, no
entanto, desenvolver o argumento oposto. Por agora, de Jean Luc
Melanchon, um dos líderes da Frente de Esquerda, a abstinência é como
"uma insurreição cívica. A mídia colocou as eleições sob a bandeira do
exame nacional do político executivo, Nicolas Sarkozy. Ontem à noite,
o primeiro-ministro francês François Fillon, prejudica esta análise e
disse que a abstenção muito elevada não é permitido dar a esta
primeira fase de julgamento de valor nacional. A equipe presidencial
veio para destilar sua defesa. Vários assessores de Sarkozy, disse na
imprensa que a abstenção "destrói" o argumento da esquerda em sua
tentativa de fazer essa votação de um referendo regional anti-Sarkozy.
Manuel Vals, deputado socialista e prefeito da cidade de Evry, em vez
pensou que Nicolas Sarkozy é responsável pela abstenção: "Pela sua
atitude, os resultados da sua política e sua política, o Presidente
tem uma responsabilidade clara importante ".
Apesar de não partilhar a interpretação do resultado, esquerda e
direita estão agora por trás do mesmo desafio: mobilizar os eleitores
na segunda rodada para confirmar a vitória-PS-e limitar a profundidade
do abismo da derrota, UMP. O primeiro secretário do Partido
Socialista, Martine Aubry, ler os resultados em outro sentido, dizendo
que "o francês enviou uma mensagem forte e clara. Expressou hoje a
rejeição de uma França dividida, enfraquecida e aflita e, acima de
tudo, queria expressar o seu desejo de uma França mais justa e mais
forte. " O PS realmente viveu em duas eleições: no chão regionais e
outras mais para a candidatura presidencial para as eleições de 2012.
Os seus protagonistas são os mesmos Martine Aubry e ex-candidato
presidencial dos socialistas em 2007, Ségolène Royal, que está
funcionando para manter a presidência do Poitou Charentes.Com 40 por
cento dos votos, Royal tem todas as cartas na mão para a reeleição no
domingo. Isso também é mantida intacta a sua influência sobre a
opinião pública, que só vai incitar antagonismo caro no coração do PS
entre Ségolène Royal e linha de Martine Aubry. Foi essa guerra
implacável, vulgar, com tiros baratos e reclamações de todos os tipos
que hipotecou grande parte da credibilidade do PS.
Além dos socialistas, a confirmação de Ecologia fluxo tão influente e
legitimidade das listas de esquerda dissidente, esta eleição marcou o
retorno dos falcões da extrema direita. O ultra-direitista Jean Marie
Le Pen surgiu ontem à noite triunfante diante das câmeras de televisão
em uma mesa onde tinha colocado o autor da polêmica campanha da Frente
Nacional afirmou que "o Islã" não é coberto por uma faixa onde se lia
"censurado". A natureza racista e agressivas deste cartaz, que
caracterizou o mapa francês da Argélia, coberto com as cores do
míssil, foi proibida pela Justiça na sequência de uma queixa
apresentada por várias associações. Le Pen disse, essencialmente: "A
Frente Nacional voltou ao The Game". As eleições de 2007 parecia ter
sepultado, mas ressuscitou pesquisas regionais. Isso parece confirmar
a relevância da análise de todos os que criticaram as escaramuças na
direita no poder nos territórios da mão direita extrema do debate
sobre identidade nacional e outros lapsos menos digno para a
extrema-direita. Em vez de servir as listas presidencial, essa
"invasão" beneficiou do discurso original. Estas eleições cristalizou
a plenitude do francês para o modo como os políticos representam.
Nacionalmente, a análise inicial sugere que as pesquisas na noite de
domingo marca o fim do sarkozysmo "(Libertação) e expressar tanto o
desejo por algo mais, o desejo de lançar uma outra dinâmica política.
Os eleitores, vire à esquerda no poço, que desenhou os contornos dessa
dinâmica.

Por Eduardo Febbro
From Paris

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A Burca como Cultura da Resistência

Burqa a MetàImage by FotoRita [Allstar maniac] via Flickr


António Campos

Volto a estudar Schopenhauer, que considero ser o filósofo certo para o nosso tempo indigente e decadente: o seu pessimismo é a denúncia da corrupção e da crueldade. Como diz Schopenhauer, o optimismo é uma opinião ímpia, uma zombaria odiosa, em face das inexprimíveis dores da humanidade. Horkheimer tem razão quando destaca a actualidade do pensamento de Schopenhauer. Devemos confrontar os optimistas com a sua malvadez e o seu egoísmo extremo. Dado não pretender apresentar uma leitura integral do pensamento de Schopenhauer, limito-me a reproduzir aqui comentários dispersos que fiz na caixa de comentários do post anterior.

A Filosofia é deveras complicada, sobretudo a dialéctica. O pensamento tardio de Horkheimer não é tão reaccionário como disse Bloch: a filosofia de Schopenhauer merece ser pensada em relação ao marxismo, porque o seu pessimismo não é incompatível com a teoria de Marx. Este último sabia que a história se desenvolve pelo seu lado mau e chamou pecado teológico ao processo de acumulação do capital. A solidariedade marxista de classe converte-se, neste mundo cada vez mais global, em solidariedade com os que sofrem nas mãos dos malvados. A linguagem de Marx é muito teológica. Os marxistas interpretaram o pessimismo como uma espécie de rendição à maldade existente, mas Schopenhauer descobriu que o fatalismo era a única consolação impingida pelos malvados às suas vítimas.

Ora, Marx denunciou o economicismo fatalista, a actual ideologia neoliberal dos gestores e dos administradores. Mas há outra semelhança estrutural entre Marx e Schopenhauer: cada um de nós é, ao mesmo tempo, carrasco e vítima, no sentido de termos interiorizado o opressor e a sua dominação. Bloch chamou reaccionário a Horkheimer, porque ele acreditava na possibilidade de mudar o rumo da história, cuja lógica imanente conduz - segundo Horkheimer - ao mundo totalmente administrado. O problema reside talvez no facto de Horkheimer ter levado a sério a doutrina do mundo como representação, no seio do qual somos escravos, mas a doutrina do mundo como vontade infinita abre-se à liberdade. Este período da filosofia é muito fértil e complexo: as dores do mundo denunciam o carácter ideológico do optimismo. Do ponto de vista teológico, há uma grande proximidade entre Horkheimer e Schopenhauer, mas falta reavaliar a antropologia negativa que, se for vista nos moldes da teologia negativa - a concepção de Deus que não pode ser representado e que é solicitado para salvar um sentido absoluto e suscitar a esperança de que existe um Absoluto -, então o carrasco ameaça confiscar-nos a palavra e triunfar. A teoria da reificação como esquecimento implica uma visão da linguagem e o despertar da memória, mas deve ser pensada em ligação com o fetichismo da mercadoria de Marx. Este capítulo d'O Capital é a obra fundamental da filosofia contemporânea.

Somos convidados a revisitar a teoria da maldade radical que Schopenhauer descobre no pecado original. A Filosofia dispensa a ciência que nada tem a dizer sobre aquilo que nos preocupa: a ciência é conhecimento de domínio e, como tal, é mais um instrumento da inteligência. Ora, também aqui Schopenhauer subordinou o intelecto à vontade, o que lhe mereceu o elogio de Freud. Não estou a propor a moral da piedade ou da compaixão como solução final, embora aceite a noção de solidariedade universal no sofrimento, aliás uma ideia grata a Sampaio Bruno. A abertura ao teológico não implica o regresso da religião, porque, na esfera filosófica, não há culto: a filosofia recusa a idolatria. Porém, a libertação pela via ascética vislumbrada por Schopenhauer é extremamente sedutora, porque implica resistência: o despojamento é a negação do capitalismo. Suprimir a vontade de viver é negar o capitalismo e o reino do mal existente.

O suicídio pode ser visto como a liberdade levada à sua plena consumação. Aqui distancio-me de Schopenhauer: o suicídio não é levado a cabo porque se deseja a vida; o suicídio pode significar a esperança numa outra vida liberta da maldade humana. Neste caso, o homem - apesar de desamparado - pode fintar a vontade infinita, dizendo não à vida em todas as suas determinações.
Na minha economia cognitiva, estou pronto a colocar a filosofia em confronto com a ciência, que, na realidade, não é sabedoria. A noção positivista - isto é, filosófica, - de que a filosofia tende a ser ciência é falsa. Hoje em dia, a filosofia não quer produzir uma teoria do conhecimento para a ciência. A sua tarefa é outra: mostrar que a ciência é mera ideologia instrumental. A ciência só foi ciência enquanto teve a guarda da filosofia. Hoje a filosofia nega a paternidade: a ciência é, neste momento, uma bastarda. Já nem merece ser tratada como uma forma de conhecimento: é pura técnica. O cientista de hoje é um funcionário, um escravo do sistema que lhe nega a dignidade. E os cientistas que dizem ser descendentes de macacos são isso mesmo: macacos que se arrependeram de ser homens.

Isto traz à minha memória a teoria de Calvino que, lida à luz da Cabala, pode ser integrada na nova síntese filosófica: há animais que são humanos e há outros que parecem ser humanos mas não são humanos. Uma vez que a reconciliação está para além dos poderes humanos, podemos no entanto tentar domesticar a maldade. O pensamento aqui aflorado é perigoso, mas deve ser pensado, até porque não temos nada a perder. Já não podemos perder nada... O objectivo é restituir a humanidade aos homens que a perderam - os animais metabolicamente reduzidos que mantêm o sistema em funcionamento. O despojamento é a libertação do calvário do consumo. O sistema não funciona se os homens humanos recusarem a vontade de viver que os liga ao sofrimento do mundo. Com este pessimismo radical mas expectante, podemos salvaguardar a teoria de Marx, generalizando-a a todos os que sofrem, incluindo os outros seres vivos: o marxismo como humanismo global.
A solidariedade no sofrimento universal exige despojamento: devemos começar a tapar o rosto com um véu para não sermos identificados pelos opressores. O rosto identifica-nos e o sistema usa-o para nos controlar. Homens e mulheres devem tapar o rosto, de modo a mostrar a sua solidariedade no sofrimento e a evitar a sua identificação como peças submissas do sistema: a generalização da burca ou do véu a tapar o rosto significa resistência contra o sistema que nos nega a dignidade, sem mostrar o rosto ao carrasco.

J Francisco Saraiva de Sousa



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sexta-feira, 12 de março de 2010

A manipulação pela religião

Guadalupe @ Ciudad de MéxicoImage by Gorski via Flickr


António Campos

A religião tem sua base assentada sobre três pilares fundamentais e que se auto-sustentam. Esses pilares chamam-se em grau de importância economia, política e crença. Mas porque a fé estaria em último lugar? Simples: Pegando como exemplo a Igreja Católica, o mais complexo e sólido sistema religioso organizado sob o nome de Catolicismo, antes de tudo, devemos entender que nenhuma religião sobrevive sem dinheiro, vide a Igreja. Ela possui uma complexa rede de seminários, colégios, universidades, santuários, congregações, templos e é claro, sem contar, a magnífica sede do Vaticano. Tudo isso requer custos, entretanto, como muitos se enganam, a fonte de renda da Igreja menos importante são as doações dos fiéis. A prova é tanta que a Igreja Católica aboliu a lei do dízimo o que significa uma auto-suficiência financeira. Diferente de outras igrejas como as protestantes que dependem do dízimo para se manterem funcionando.

Entretanto como vimos a Igreja possui um património tão absurdo que o custo para mantê-los vai além das doações dos fiéis, e nem todo o património que a mesma possui poderia suprir tal necessidade. Desse modo, a principal fonte de renda da Igreja está assentada no seu banco nacional. Fundado no pontificado de Pio XII em 1942, o Banco tinha a função de gerir o então recém fundado Estado do Vaticano, criado mediante um acordo político com o ditador italiano Mussolini. Após um tempo, o Banco passou a ter mais uma função do que guardar os bens do Vaticano. Para ajudar na reconstrução económica da Europa, o banco passou a servir de financiador e até de paraíso fiscal sendo receptor de bens não declarados de grandes empresários da Europa. Muito mais seguro que as Ilhas Cayman, ele cobrava altos juros, garantindo o isolamento económico assegurado pelo património da Igreja, desse modo impedindo um "crack" como aconteceria com o resto do mundo caso houvesse uma crise, pois mesmo sendo nacional, a Economia do Vaticano "não possui" relações económicas oficiais com outras nações.

Desse modo, o primeiro pilar da religião está assente na Economia, uma vez que sem ela os outros dois pilares não podem se sustentar. Sendo independentemente económico, o Estado do Vaticano tem credibilidade no cenário político internacional, uma vez que ele tem autonomia para firmar discretamente acordos com quaisquer países, principalmente na Europa onde a política e a religião estão ligadas à séculos. O secularismo, embora tão defendidos e pregados como uma realidade, na verdade é um engodo, uma bela ilusão, uma vez que justamente por possuir credibilidade na política internacional, o Vaticano pode manipular a política a seu belo prazer como já fazia há anos. O que o Vaticano quer é fiéis, não porque precise para sobreviver economicamente, mas a partir do momento em que a Europa está unida sob uma crença, a ameaça estrangeira, vide actualmente, o Islão, não ameaçaria a estabilidade social. Social, vide económica, pois tudo o que está em jogo são interesses económicos.

Desse modo ao poder interferir na política mundial o contrato torna-se simples. O Vaticano mantém as tradições na Europa segundo os moldes já existentes, afinal a razão da tradição é perpetuar-se pelos séculos, assim o Vaticano financia campanhas de partidos e candidatos conservadores. E desse modo mantendo esses políticos no poder, ela mantém seus costumes na sociedade. O interessante é que justamente depois da criação do Banco do Vaticano, houve uma onda de conservadorismo invadindo os países europeus, e coincidentemente muitos movimentos totalitários e conservadores como o actual presidente italiano, Silvio Berlusconi, um fascista declarado, é amplamente apoiado por membros do clero, vulgo, a Igreja. Mantendo esses políticos no poder, a Igreja mantém essa relação financeira de apoiar certos partidos para que com isso, esses governos eleitos incentivem a aplicação financeira de várias empresas no Banco do Vaticano.

Sobre o último pilar, este é consequência. Na verdade os fiéis interessam principalmente ao Estado. Como cidadãos, o único propósito da Igreja precisar de fiéis é que primeiramente esses fiéis pagam impostos ao Estado, que por sua vez por meio de acordos financiam a sustentabilidade da Igreja. O segundo propósito está em manter a tradição, primeiramente a tradição social, uma vez que esse sistema de contribuição mútua vem desde a época de Constantino onde o Estado garantia a sustentabilidade da Igreja e vice-versa. Assim a função dos fiéis é garantir a perpetuação dessa ordem estabelecida. E voltando à questão do choque cultural, por não querer que essa ordem seja destruída por outra, a unidade de um continente por meio da religião simboliza uma blindagem contra outros sistemas político-religioso como o Islão que cada vez mais ganha espaço na Europa. Desse modo, mais que uma valorização da crença existente, cria-se uma fobia à outra crença/cultura.

Por isso um minarete muçulmano não é o símbolo de uma religião do Médio Oriente e sim o símbolo de um sistema social organizado que possui seus interesses em conflitos com os de outro. Da mesma forma esse conflito expande-se por outras religiões organizadas, seja em âmbito nacional, continental ou global. Com isso cria-se uma perigosa situação onde há uma situação de conflito de natureza económica estabelecida sob uma justificativa religiosa. Por isso foram realizadas as Cruzadas, por isso foi realizada a Intifada, por isso recentemente a população dos EUA defendeu a “guerra contra o terror” sob o pretexto de defesa da soberania do ocidente judaico-cristão. E o pior disso tudo, é que justamente por haver a crença num sistema religioso que os povos são levados a acatarem essas decisões políticas sob nuvens de justificativas religiosas e culturais. Levando em conta que a religião está intimamente ligada à cultura de um povo, ao criar-se um conflito de culturas, o foco desse conflito estabelecido no meio social sempre será voltado primeiramente à crença, com isso, a “ameaça” que a cultura seria atacada por ser considerada fraca pela outra, tornar-se ia na verdade uma “ameaça” onde a crença é que estaria sob o julgamento de ser inferior, ou do Deus dessa crença ser fraco.

Com isso, não é estranho que os homens se matem uns aos outros em nome de Deus, por isso é preciso que o mundo acorde para a realização de um diálogo inter-religioso, e principalmente, que a globalização não se torne um choque de culturas, gerando conflitos muito mais graves, mas uma oportunidade de buscar-se uma trégua nesses conflitos seculares onde os únicos prejudicados são os indivíduos que compõem essas sociedades, só que alienados mediante à fé cega tão pregada semanalmente nos púlpitos dos templos e incentivados pelo culto ao patriotismo e às tradições seculares, faz com que esse ciclo seja indestrutível, e quanto mais ele dura, mais difícil fica de modificá-lo, gerando graves consequências para a evolução social da humanidade.

Posted por Shaka Kama-Hari



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quarta-feira, 10 de março de 2010

A Teoria da Incomodação Zero

ISKANDARIYHA, IRAQ - JANUARY 21:  An Iraqi wor...Image by Getty Images via Daylife


António Campos

Os homens distinguem-se dos animais, não porque têm consciência, já afirmavam teorias sociológicas do fim do século XIX, mas porque produzem as condições de sua própria existência. Estas condições são, em grande parte, oriundas do trabalho, que sempre fez parte da vida humana. Contudo, desde que surge a propriedade privada capitalista, a relação de trabalho estabelecida entre empregador e empregado passou por muitas transformações. O trabalho consistia em sinónimo de segurança, de um ambiente ordenado, regular, confiável e duradouro. Em uma época não tão distante, o imediatismo não figurava como valor maior, e a lógica do trabalho se assemelhava a uma construção: tijolo a tijolo, andar a andar, no trabalho lento, que findava com uma obra sólida e firme – a carreira.

Mas hoje o status do trabalho parece estar subvertido ou, ao menos, tem se revestido de características muito distintas das de outrora. O sociólogo polaco Zigmunt Bauman revela-nos que o novo perfil do trabalhador, procurado pelas empresas, não é mais exactamente aquele que prima por um sujeito íntegro, enraizado em valores, com princípios e tradições sólidas. O mais novo filtro utilizado nesta escolha é de outra natureza. De acordo com Bauman, desde 1997, usa-se nos EUA uma expressão que designa o perfil de trabalhador que o mercado procura, o chamado “chateação zero”. A expressão cómica, mas extremamente reveladora, mostra-nos que o trabalhador que possuir menos factores potenciais para chatear ou incomodar a empresa durante o seu labor será aquele com maior possibilidade de conseguir a vaga. Por exemplo, um sujeito dotado de família e filhos tem o seu nível de chateação elevado, pois provavelmente não terá tanta flexibilidade para aceitar tarefas em qualquer horário ou local.

Ora, se é um empregado que ousa questionar as relações e que procura cumprir as suas obrigações, cobrando dos demais o mínimo de responsabilidade, saiba que você possui um nível de chateação elevadíssimo. Vantajoso é ser alguém descomprometido com a realidade social, com laços afectivos frágeis e que possa estar sempre à disposição. A preferência é por “empregados ‘flutuantes’, acríticos, descomprometidos, flexíveis, ‘generalistas’ e, em última instância, descartáveis (do tipo ‘pau para toda obra’, em vez de especializados e submetidos a um treino estritamente focalizado)”, afirma Bauman. O mercado de trabalhadores é também um mercado de produtos.

Neste ambiente “líquido-moderno”, estendemos o retrato da prática do consumo para as demais instâncias da vida, como parece ocorrer com as actividades do trabalho. Uma predilecção pela facilidade, desprendimento e individualização. Um produto é comprado, usado até perder o valor e depois descartado, pois uma imensidão de outros estará à disposição. O trabalhador assume, enfim, o status de descartável. Incomodando zero, disponível sempre e criticando nunca.

Juliana Salbego

Publicitária e professora do Curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Pampa
Fonte: Jornal Zero Hora
Imagem em: http://reflexoescorporativas.wordpress.com/2009/08/



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segunda-feira, 8 de março de 2010

100 anos atrás: o Dia da Mulher (1910-2010)

International Women's Day.Image via Wikipedia


António Campos

As mulheres são uma força revolucionária. Esse facto mostra em suas férias, International Women's Day (IWD), tanto o seu passado e presente.Porque o sistema de lucro depende do estatuto de segunda classe das mulheres, o dia que se homenageia é obrigado a ser ligado a acontecimentos importantes.
Havia pelo menos 984 eventos no ano passado em 64 países. O dia é um feriado oficial em 29 países - não é por acaso, principalmente aqueles com uma história anti-capitalista. Eles incluem a China, Cuba, Vietnam nos estados da antiga União Soviética e da Europa Oriental, e alguns na África.
As nações mais ricas - Norte-americanos e países europeus, Austrália - não o reconhecem. É notável que tanto IWD e May Day, feriado internacional dos trabalhadores, foram iniciados para comemorar as lutas dos trabalhadores os E.U. - mas não é reconhecida oficialmente, no coração da Capital.
Um começo militante. O feriado raízes estão nas lutas das mulheres trabalhadoras e os seus apoiantes socialistas. Acredita-se que foi um protesto em massa das mulheres e dos trabalhadores têxteis em Nova Iorque em 1857 ocorreu em 8 de março, e que, em Março, dois anos depois, a mesma mulher ganhou uma unidade sindical. Eles estavam lutando contra as brutais condições de trabalho, salários baixos, e as 12 horas do dia.
Em 8 de março de 1908, as mulheres socialistas organizaram uma manifestação de 15.000 em Nova York. Suas demandas foram aumentos salariais, menos horas, a votação, e um fim ao trabalho infantil. Depois disso, o Partido Socialista da América decidiu comemorar um dia das mulheres nos os E.U., a primeira das quais teve lugar em 1909.
Dia Internacional da Mulher foi fundado no ano seguinte, um século atrás, a Segunda Conferência Internacional de Mulheres Socialistas realizada juntamente com o Congresso da Internacional Socialista em Copenhaga, Dinamarca. Os participantes representados partidos socialistas, clubes de mulheres, e os sindicatos, e incluiu as três primeiras mulheres eleitas para o parlamento finlandês, numa altura em que poucas mulheres tinham o direito de voto.
E.U. delegados foi a intenção de propor um dia internacional da mulher, só para mostrar que a feminista alemã Clara Zetkin tinha vencido . Zetkin foi um membro proeminente do partido socialista alemão, que teve uma forte história de defesa dos direitos das mulheres. Mulheres de 17 países votaram por unanimidade a criação do feriado. No ano seguinte, 1911, as celebrações começaram com um estrondo, com mais de um milhão de pessoas manifestam-se em Alemanha, Áustria, Dinamarca e Suíça.
A necessidade de tal dia tem um impulso a refrigeração, mas poderoso do grande incêndio na fábrica Triangle Shirtwaist de 25 de março de 1911, em Nova York. Saídas Locked pobres e medidas de segurança causou a morte de 146 trabalhadores, maioritariamente mulheres. Tornou-se um escândalo internacional para a organização do trabalho inflamado. Ele ajudou a construir a International Ladies Garment Workers Union, que foi um dos primeiros sindicatos principalmente do sexo feminino e se tornou um dos maiores sindicatos de os E.U.
Em 1913 e 1914, como o batuque para a I Guerra Mundial estava começando a soar, IWD grandes manifestações pedindo paz teve lugar na Europa. A I Guerra Mundial começou em agosto de 1914. Durante vários anos, IWD foi reprimida tanto por governos capitalistas e por alguns partidos socialistas, aqueles que tinham traído trabalho internacional de solidariedade de classe, apoiando suas próprias nações em guerra.
Foi uma faísca revolucionária. Mas o mais momentoso IWD até agora foi na Rússia, em 8 de março de 1917. A história é contada magnificamente Leon Trotsky em História da Revolução Russa. As mulheres começaram a insurreição que derrubou o czar todo-poderoso - e levou à Revolução Bolchevique oito meses mais tarde.
Trabalhadores têxteis Mulher em São Petersburgo estava desesperado e irritado por causa da grave escassez de alimentos e ao abate de vários milhões de soldados russos na guerra. Eles entraram em greve, e apelou a outras fábricas para os apoiar. A greve e as manifestações aumentaram de dia para dia, e cinco dias depois, a monarquia russa tinha ido embora para sempre.
Revolta em curso. IWD não é apenas uma ocasião cerimonial. No Irão, em 2007, a polícia reprimiu violentamente um protesto IWD e prenderam dezenas de mulheres. O dia tem uma história de militância no Irão ».
Em IWD em 1979, no meio da revolução que derrubou o xá apoiado pelos EUA, e logo após a direita regime islâmico do aiatolá Khomeini chegou ao poder, 100.000 mulheres e adeptos do sexo masculino subiu na Universidade de Teerão. Então, 20.000 mulheres, com roupas ocidentais, em vez de o véu comprimento mandato completo, marcharam através da cidade. Os protestos foram organizados em outras cidades também. As mulheres exigiam igualdade de direitos, incluindo o direito de vestir-se como quisessem. Vigilantes religiosos dispersaram as mulheres, embora elas lutassem ao longo de vários dias. Foi o fracasso dos partidos de esquerda para defender as mulheres que levaram à derrota final da revolução.
A Liderança feminina é uma marca de água de alta nas lutas numerosos demais para contar. As trabalhadoras foram determinantes para nacionalizar os bancos durante a revolução incompleta portuguesa em 1974. As mulheres desempenharam um papel vital em convulsões latino-americana da década de 1980, incluindo a rebelião sandinista da Nicarágua. Europa nos anos 80 viu um aumento enorme do feminismo, sobretudo dentro dos partidos socialista e comunista.
No ano passado, as mulheres desempenharam um papel de vanguarda na insurreição em Honduras contra o golpe que depôs o presidente democraticamente eleito, Manuel Zelaya.
Nos E.U., o enorme movimento feminista lançado na década de 1960 começou com objectivos radical. Apesar da realização de algumas reformas e uma mudança nas atitudes sociais, estes objectivos continuam a ser cumpridas - como acontece no resto do mundo.
O dinamismo eo papel revolucionário das mulheres trabalhadoras que IWD comemora é uma chave para entender os nossos tempos. Revoltas por aqueles na parte de baixo contra os crimes da mola do sistema de lucro acima continuamente. E aquelas no fundo são mulheres, de todas as cores e nacionalidades e convicções sexuais, e como a parte mais injustiçado de todos os outros grupos oprimidos.
No processo de realizar sua própria libertação, as mulheres serão essenciais para a libertação da humanidade.

Megan Cornish - Global Research, 8 de março de 2010(traduzido).

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