sexta-feira, 29 de abril de 2011

Democracia contra regime austeritário

Le Monde diplomatiqueImage via Wikipedia



António Campos


(passados poucos meses mas mantém-se actual)


A 24 de Novembro de 2010, a greve geral convocada em Portugal pelas duas centrais sindicais, a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP) e a União Geral dos Trabalhadores (UGT), a primeira desde 1988, vai juntar-se às amplas movimentações sociais de contestação às medidas de austeridade orçamental que os governos da União Europeia têm vindo a adoptar. Essas medidas têm em comum o facto de deixarem incólume um sector financeiro que, apesar de ser responsável pela crise, está a ser consentidamente deixado à solta pelos poderes públicos para regressar, como já regressou, à realização de lucros tão astronómicos quanto imorais. E têm também a uni-las a escolha que os governos europeus fizeram de penalizar, pelo contrário, aqueles que apenas vivem do seu trabalho ou aqueles que subsistem através de prestações sociais para as quais descontaram antes da reforma ou do desemprego, bem como os que sobrevivem com subsídios a que se vêem obrigados a recorrer ao serem atingidos pela pobreza. Uma escolha a todos os títulos desastrosa, porque regressiva em termos societais e recessiva em termos económicos.

Na verdade, os governos europeus, independentemente da sua cor política, parecem sentir-se mais mandatados para defender os direitos inalienáveis dos mercados do que os dos cidadãos. Com os primeiros têm compromissos sérios, que não podem deixar de honrar; com os segundos têm combinações frouxas, que podem substituir pela imposição de duríssimos sacrifícios. Só assim se explica que tais governos se tenham posto em sintonia para congelar e cortar salários, pensões e a generalidade das prestações sociais; para utilizar a pressão de um desemprego duradouramente acima dos 10% de modo a nivelar por baixo os direitos laborais; e para promover um aumento das desigualdades socioeconómicas e uma degradação dos serviços públicos, ameaçando fazer colapsar o Estado social.

O regime democrático, de que o Estado social é um dos pilares fundamentais, encontra-se sempre ameaçado quando as políticas salariais, fiscais e de acesso aos serviços públicos fundamentais não são suficientemente universais nem redistributivas para reduzirem o fosso das desigualdades socioeconómicas. Era já o que acontecia antes da crise em países como Portugal, um dos mais desiguais da Europa. Mas esta resposta à crise veio juntar-lhe um outro fosso, que põe em perigo as bases políticas de qualquer democracia, que é o fosso entre as políticas implantadas e os programas políticos com que os governos foram eleitos. Também neste aspecto, o caso português é um exemplo flagrante dessa dissociação, a qual encerra um forte potencial corrosivo das próprias bases em que assenta a representação democrática, como expressão da vontade dos cidadãos. O preço a pagar por agentes financeiros felizes e capazes de enriquecer pelo controlo do acesso ao crédito (e das condições em que esse acesso se faz) poderá bem vir a ser, não apenas economias submersas em recessões prolongadas e sociedades mais desiguais e com menores níveis de bem-estar, mas também democracias tão irreconhecíveis que se tornam irrelevantes, senão mesmo dispensáveis.

O novo regime que está a ser imposto como inevitável na União Europeia, e que bem se pode chamar regime «austeritário», representa uma séria ameaça para o contrato político, económico e social em que se fundamenta a democracia. A firme recusa dessa ordem insustentável que os movimentos sindicais e sociais estão a mostrar aos governos da União Europeia, de Atenas a Paris, de Madrid a Bucareste (ver o dossiê dedicado ao tema nesta edição de Novembro), vai em Novembro passar por Portugal. O povo europeu em construção, fazendo lembrar o operário em construção do belo poema de Vinicius de Moraes, faz, com a sua recusa da austeridade, uma clara aposta na democracia − uma democracia substantiva e não para especulador ver.

Do êxito do movimento social vai depender em grande medida a possibilidade de se inverter o rumo das desastrosas políticas de austeridade. Mas este movimento coloca desde já na agenda política e social, além dos conteúdos concretos que defende, algumas questões que não estavam propriamente nos planos dos que gostariam de convencer os cidadãos a aceitar, sem resistência e sem esperança, estes e os próximos pacotes de austeridade. Entre essas questões encontra-se certamente a do aprofundamento de caminhos de solidariedade, seja ela entre gerações (dos estudantes aos reformados), entre trabalhadores em diferentes situações (assalariados, precários, desempregados) ou entre trabalhadores de diferentes regiões e países (veja-se o caso dos trabalhadores belgas da Total, que em Outubro bloquearam os depósitos de combustível de que precisavam as companhias petrolíferas francesas, assim apoiando os grevistas franceses).

Não haja dúvidas, as possibilidades de inversão das políticas de austeridade que o movimento social abre são de tal forma preocupantes para os governos europeus que a reacção será enérgica, e tão concertada quanto as políticas que o motivam. Todas as novelas orçamentais serão alimentadas pelas forças políticas que defendem as medidas de austeridade, não tanto para deslocar as atenções para diferenças que podem ser pequenas entre os protagonistas, mas para instalar entre os cidadãos um sentimento de desilusão com «a política» e «os políticos», visivelmente incapazes de resolverem os verdadeiros problemas com que eles se confrontam entre novelas − desilusão essa que é o caldo de todos os populismos e derrapagens autoritárias. Os meios de comunicação seguirão estas peripécias com a grande excitação do directo, da fulanização e da história rocambolesca que se conta a si mesma. Mas seguirão também algumas greves e manifestações, salientando o mais leve episódio de violência que possam associar-lhes e pondo em palco comentadores e analistas que, vindos agora prioritariamente do campo da sociologia e outras ciências sociais, farão tão pouco pelo pluralismo de opinião na comunicação social como acontece já hoje com os concordantes economistas que vemos nos ecrãs das várias televisões.

Seja como for, a simples existência de movimentos como a greve geral de 24 de Novembro são fortes sinais de que ainda há, mesmo entre os mais prejudicados pelo regime «austeritário», cidadãos apostados em defender a democracia. Os poderes públicos, e em particular os governos que mais se queixaram de não ter alternativa, de que a pressão dos mercados é demasiado forte (como o português), têm aí uma oportunidade de reajustar as suas políticas pelo diapasão da democracia substantiva. Irão fazê-lo?

 por Sandra Monteiro
Le Monde Diplomatique em português
Nov.2010

http://pt.mondediplo.com/spip.php?article773
 


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terça-feira, 26 de abril de 2011

Como Se Fora Um Conto - Vigaristas que mereceriam ser presos

Library of the Palace of Mafra designed by Man...Image via Wikipedia



António Campos


Quem nos disse que já sabia o que nos ia acontecer? Todos e mais os outros!

Há muitos meses, anos até, que se ouve nas ruas, nas mesas de café, com vozes baixas e medrosas mas também em frases inflamadas e ditas bem alto, a revolta surda das gentes anónimas. E no entanto… !

Em nenhum momento o povo Português teve qualquer tipo de dúvida (excepto os mandantes deste pobre País e também os que querem vir a sê-lo, mas esses não pertencem ao povo) de que a Justiça em Portugal não funciona nem funcionará tão cedo, de que ninguém irá para a cadeia no famoso caso Casa Pia, da mesma forma que as dúvidas não existem sobre o mesmo desfecho em qualquer dos grandes casos de Justiça que ainda hoje correm nas barras dos tribunais.

Ninguém alguma vez duvidou de que o Orçamento para 2011 acabasse por ser aprovado, pese embora todo o folclore protagonizado pelo governo e por alguma oposição.Toda a gente sabia que o actual Presidente da República se iria candidatar, apesar dos tabus em que é useiro e vezeiro e a que sempre nos habituou. Não há quem não saiba, por força das evidências, que o ano de 2011 vai ser ainda mais terrível que o actual, embora ouçamos todos os dias o ainda nosso Primeiro a dizer que estamos cada vez melhor e que não precisamos do Fundo Monetário Internacional no nosso País.

Todos sabemos da falta de credibilidade do nosso governo a nível Nacional e Internacional, fruto das sucessivas mentiras e enganos do ainda nosso Primeiro e do seu Ministro das Finanças. Não há dúvidas algumas, seja de que espécie forem, de que o ainda nosso Primeiro não quer governar e que espera ansiosamente que alguém piedoso o coloque dali para fora o mais rapidamente possível, e que no fundo, ninguém quer, hoje, o seu lugar. Há muita gente do nosso País que duvida da capacidade do líder do maior partido da oposição para vir a ser o nosso próximo Primeiro e ao mesmo tempo o salvador da Pátria, e não se revê em qualquer outro que por cá existe.

Todo mundo Português sabe da enormidade de vigarices que por cá existem, dos roubos, desvios, compadrios, mentiras, subornos, influências, e de outros actos ilícitos e criminosos praticados pela grande maioria dos responsáveis pelo nosso País, e aceita que a Justiça feche os olhos ou finja que não vê, esperando no mais profundo do seu íntimo que um dia chegue a sua vez de ser e fazer como eles para poder enriquecer rapidamente. Face a tudo isto, e a ainda uma mão cheia de coisas que não abordei aqui, só se pode concluir que o que nos acontece é totalmente culpa nossa que só falamos e nada fazemos de consequente, e que, enquanto povo, somos uma cambada de carneiros imbecis e ignorantes, e seguidores cegos de líderes vigaristas que mereciam ser presos e condenados a trabalhos forçados para todo o resto das suas vidas.
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Mas isto vai tudo melhorar, o nosso País ainda vai ser um Pais em condições, com gente honesta e solidária, um dia, quem sabe, quando e se houver uma invasão ou uma outra revolução, quando toda a população de vígaros for presa, quando mudarmos a educação e as mentalidades das pessoas, ou quando mudarmos totalmente as gentes que cá vivem.

de José Magalhães
Nov.2010

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sábado, 23 de abril de 2011

A estagnação pode perdurar décadas sob o regime do capital monopolista financeiro

Image representing New York Times as depicted ...Image via CrunchBase

António Campos



Embora a Grande Recessão tenha oficialmente terminado há mais de um ano (Junho de 2009) na economia dos EUA, para a maior parte do povo – especialmente os desempregados a longo prazo, minorias e juventude – os efeitos estão longe de ultrapassados. Na verdade, é uma medida do mal-estar económico nos quais os países industrializados permanecem atolados que o espectro da estagflação esteja outra vez a assombrar o discurso dominante. Como observou recentemente Paul Krugman, a economia dos EUA está a experimentar "o que parece cada vez mais como um estado permanente de estagnação e alto desemprego" afim à década de 1930 (" This is Not a Recovery ", New York Times, August 26, 2010).

Krugman não está sozinho ao destacar a estagnação económica a longo prazo. Barry Boswort, economista da Brookings Institution que actuou nas administrações Johnson e Carter, em Setembro respondeu a uma pergunta sobre o estado da economia na Bloomberg Television dizendo: "Penso que estamos a entrar num período de uma espécie de estagnação" semelhante àquele do Japão a partir da década de 1990 ("Brookings' Bosworth Interview on U.S.Economy,"Bloomberg.com, September 9, 2010). James Bullard, presidente do Federal Reserve Bank of St. Louis, emitiu um relatório ("Seven Faces of 'The Peril,'" Federal Reserve Bank of St. Louis Review, September-October 2010) indicando que há um perigo de que "os EUA e a Europa" estarão "juntos ao Japão no pântano [da estagnação]". David Wyss, economista chefe da Standard & Poor's, declarou: "Penso que há uma possibilidade realista de que os EUA estejam a deslizar para este padrão tal como o Japão o fez — 10, 20 anos de estagnação" ("U.S. Has 'Realistic Possibility' of Stagnation", Bloomberg.com, August 24, 2010). Analistas económicos estão agora a discutir abertamente a probabilidade de que todo o mundo industrializado possa ser ameaçado por uma "década perdida" ou duas. ("Industrialised World's 'Lost Decade' Risk," AFP, September 1, 2010).

Todas as indicações são no sentido de que o sofrimento da estagnação será muito pior nos Estados Unidos do que no Japão – onde, como argumenta Krugman, ela foi administrada de modo a minimizar os efeitos sobre a população (" Things Could Be Worse ," New York Times, September 9, 2010). As medidas de gasto deficitário keynesiano tomadas pela classe dirigente japonesa em reposta à crise financeira do princípio dos anos 90 foram, num certo grau, bem sucedidas. O enorme peso de dívidas incobráveis possuídas pelos bancos foi gradualmente reduzido ao longo do tempo. O que nos Estados Unidos ou na União Europeia seria encarado como "pleno emprego" foi mantido (embora reflectindo parcialmente a baixa taxa de participação no trabalho das mulheres japonesas). A infraestrutura foi renovada em todas as áreas. Portanto, juntar-se ao "pântano" japonês seria preferível sob muitos aspectos aos avanços da classe dominante sobre os gastos sociais, agora a serem pressionados na União Europeia e nos Estados Unidos, os quais poderiam fazer "o Japão parecer-se", nas palavras de Krugman", "como a terra prometida". Assim, as referências ao "pântano" japonês deveriam ser tomadas com um grão de sal. Contudo, em duas décadas o Japão foi incapaz de encontrar os meios para levantar-se da estagnação que começou com o crash financeiro-imobiliário do princípio dos anos 1990. O Japão também, deveria observar-se, está agora sujeito a uma ampliação da divisão de classe (" Luxury Gap: How Japan Turned Into a Nation of the Haves and Have-Nots ," Independent [UK], February 6, 2008).

Os leitores da MR estão conscientes que desde há muito temos destacado a estagnação como uma tendência permanente nas economias capitalistas avançadas, enraizada no aumento da desigualdade do rendimento e da riqueza, monopolização crescente e maturidade industrial. Esta tendência de estagnação com raízes profundas foi parcialmente contrabalançada no passado pelos gastos militares, défices governamentais e, no último quarto de século, por uma mudança estrutural da produção para a finança (caracterizada pelo crescimento explosivo de dívida pública e privada). Tais estimulantes artificiais potenciam o crescimento económico no curto prazo, mas são incapazes de ultrapassar o problema estrutural a longo prazo. O resultado é que a estagnação reafirma-se como uma força de gravidade, como foi mostrado pelos recentes crashes financeiros em 2000 e 2007-09. Apesar das expansões tardias das décadas de 1980 e 1990, a taxa de crescimento económico real dos Estados Unidos (e aquelas das maior parte dos outros países industrializados ricos) tem estado a afundar década após década desde os anos 1970.

Haverá uma alternativa à actual armadilha da estagnação-financiarização? Em abstracto, a resposta é sim, mas efectuar as mudanças necessárias exige acções radicais e aí é que são elas. As mais prementes necessidades materiais nos Estados Unidos (e em todos os outros países afectados, incluindo o Japão) são por melhores condições de saúde, educação, habitação, transporte público, distribuição alimentar equitativa e protecção do ambiente. O pleno emprego poderia ser promovido através do atendimento destas necessidades urgentes. Os gastos deficitários do governo não seriam um problema sob as actuais condições de alto desemprego e capacidade produtiva subutilizada. Na Segunda Guerra Mundial, novas tomadas de empréstimo pelo governo dos EUA foram muito além dos níveis de hoje em relação ao PIB. Na medida em que o novo gasto serviu para colocar pessoas de volta no trabalho, toda a sociedade (com excepção dos ricos) acabaria numa situação melhor. Nem seria um problema financeiro tal programa em parte considerável pela comutação do fardo fiscal total em direcção aos ricos, cuja fatia relativa do rendimento e da riqueza tem estado a privar o resto de nós. Novos recursos podiam ser ganhos através do redireccionamento das despesas do governo par longe de gastos militares/imperiais e rumo a áreas que proporcionassem benefícios reais para a sociedade. Em suma, um novo New Deal radical para século XXI podia – ou assim se pode argumentar – ser executado.

Mas para cumprir isto politicamente através de iniciativas no topo, digamos que pelo governo federal sob liderança esclarecida, significaria mobilizar a massa da população na reconstrução radical da sociedade estado-unidense. Isto geraria um conflito claro com a classe dominante, a qual nenhum dos principais políticos de hoje, certamente não o presidente Obama e a sua clique de amigos corporativos, estão desejosos de considerar por enquanto. Nada que remotamente se parecesse a um novo New Deal seria apoiado pela elite do poder tanto nos Estados Unidos como na União Europeia sob o regime actual do capital monopolista-financeiro. Esta porta está fechada.

STATUS QUO CADA VEZ MAIS BÁRBARO 

Nossa conclusão: a esperança real repousa na massa da população, tanto à escala nacional como global, tomar directamente a história nas suas próprias mãos, a fim de criar um novo sistema para além do capitalismo que genuinamente sirva necessidades humanas. O que é preciso é uma maciça revolta de classe/social dos de baixo, verificando-se ao longo de meses, anos e mesmo décadas e não parando à beira da transformação social real. Será que isto acontecerá? E se acontecer, terá êxito? Ninguém sabe. Mas na ausência de certezas, não seria melhor trabalhar rumo a este objectivo ao invés de nos resignarmos ao status quo cada vez mais bárbaro?

O capitalismo é um sistema mundial imperialista. Os priores sofrimentos invariavelmente caem sobre os países da periferia, dos quais a liderança na luta contra este sistema tem-se originado durante pelo menos um século. Uma organização vital neste conflito mundial é o World Forum for Alternatives (WFA), uma rede internacional de centros de investigação e militantes intelectuais do Sul e do Norte. Criado em 1997, com Samir Amin, colaborador da MR, como seu presidente, o WFA organizou um certo número de actividades/eventos internacionais e em 2006 apresentou o famoso Apelo de Bamako (reimpresso em Samir Amin, The World We Wish to See [Monthly Review Press, 2008]). O corpo executivo da WFA consiste de, alem de Amin, do seu secretário-executivo Rémy Herrera (França) e vice-presidentes da América Latina, Ásia, África, mundo árabe, Europa e agora América do Norte. Satisfaz-nos anunciar que em Setembro o editor da MR, John Bellamy Foster, concordou em servir como o vice-presidente da WFA dos Estados Unidos. Aqueles que quiserem mais informação, visitem o sítio web do World Forum for Alternatives . 


Monthly Review

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 Nov.2010

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segunda-feira, 18 de abril de 2011

BE falha reunião com a 'troika' por a considerar "inoportuna" - JN

António Campos

BE falha reunião com a 'troika' por a considerar "inoportuna" - JN

À primeira vista causa uma certa apreensão a não comparência de alguns partidos de esquerda a esta reunião com com os negociadores do resgate a Portugal. Parece ser uma atitude um pouco primária não comparecer para depois criticar facilmente. Nunca é o interesse nacional que está em questão mesmo tratando-se de partidos de esquerda.
Não aprendemos a alargar as estratégias políticas de ação mesmo que estejam em causa o interesse nacional.

As felonias dos nossos governantes

Portuguese Parliament building front fachade.Image via Wikipedia


António Campos



Não me é fácil escrever estas palavras, menos ainda a palavra felonia, de amplo significado: Rebelião (de vassalo para com o seu senhor), traição, crueldade. Também não me é fácil adjudicar estes adjectivos às pessoas que nos governam, no melhor sentido das suas intenções, mas com mal resultado. Mal resultado não propositado, mas contudo, mal resultado para a nossa sobrevivência.

Longe de mim adjudicar o adjectivo aos nossos governantes, como tenho feito em textos anteriores. É infantil pensar que os nossos representantes na soberania da Nação, querem matar o povo à fome, apesar de ter ouvido os debates ocorridos na Assembleia. É nessa instituição onde se resolvem as leis e se orienta o caminho que a Nação deve seguir. Bem sabemos que em democracia, há diversas formas de pensar, todas elas com assento no parlamento. Todas elas com promessas de trabalho e de abrir indústrias, de criar fontes de trabalho para quem tem apenas a sua força para laboral: nem casa própria nem alugueres baixos de prédios ou quartos ou andares, para viver. Ainda mais, o preço dos comestíveis tem sido elevado por um imposto de valor adquirido, que, mal foi anunciado que seria a partir de Janeiro, os comerciantes começaram logo a cobrar. O nosso povo, habituado a obedecer aos que mandam, paga sem debater. Na minha impressão, ainda existe a ideia de os soberanos não terem de prestar contas a ninguém. A nossa monarquia foi longa demais, quase a ultrapassar os mil anos, desde 1139, com a batalha de Ourique que todos conhecemos, ao vencer os derradeiros califados que ainda governavam o Algarve e partes do Alentejo, ao triunfar auto proclamou-se rei e o povo cumprimentava-o como tal, apesar de só ter sido coroado mais tarde. Em 1179 o Papa AlexandreIII reconheceu Portugal comopaís independente e vassalo da Igreja, através da Bula Manifestis Probatum. Fonte: Miguel Sanches de Baena, Paulo Alexandre Loução, Grandes Enigmas da História de Portugal  (em Português),  [S.l.]: Ésquilo, Ano. ISBN 9729898092380, bem como em D. Afonso Henriques: 900 anos de mitos, Visão, 13 de Agosto de 2009, p. 71. Monarquia que teve várias épocas que, por serem conhecidas não vamos reiterar neste texto, acrescentarei, no entanto, a ideia de me parecer um mistério essa eterna subordinação do povo português às pessoas que o governa.

É preciso lembrar que o sistema monárquico de governo acabou somente a 5 de Outubro de 1910, donde, 731 anos de monarquia, das menos liberais do Continente. A seguir, uma República que não se entendia e a figura do Presidente era como a imagem do rei, até 1928, ao aparecer um rei civil que governou Portugal como bem quis, distante das democracias, virado para a continuação da colonização dos territórios africanos e indianos. Os investimentos portugueses estiveram, assim, sempre voltados para as fazendas de África, Índia e do Brasil, sem investir dinheiro em indústrias produtivas dentro das terras do Continente. É verdade sim, que havia estaleiros para a construção naval, mas esses barcos eram, maioritariamente, usados para a permanente conquista de colónias e para o transporte de soldados que deviam tomar conta da subordinação de todas elas e transportar bens produzidos no Portugal ultramarino, sem nunca os governantes se questionarem da possibilidade de um dia essa riqueza vir a acabar, como aconteceu. Os próprios soldados repararam nas injustiças cometidas nas terras exploradas, de esse intrujar nas formas de vida de etnias que tinham reis, as suas leis e os seus costumes. Os antigos invasores que tenho entrevistado, confessam que era um crime essa dupla atitude: escravizar os colonizados e não pagar as mercadorias aos produtores, sendo vendidas todas além Portugal, por empresas de investidores portugueses que sabiam bem o multiplicador de investimentos de Lord Maynard Keynes e como fazer render esse lucro em empresas fora de Portugal, especialmente em África que nunca pensaram perder.

 John Maynard Keynes (The general theory of employement, interest and money, 1936), revolucionou a teoria macroeconómica de tradição neoclássica, propondo que o capitalismo é um sistema económico instável, cujos desequilíbrios não poderiam ser resolvidos automaticamente pelos mecanismos do mercado. O comportamento individual dos agentes económicos – produtores, consumidores e assalariados, não observava a harmonia preconizada pela operação da “mão invisível” de Adam Smith, pelo contrário, podia originar situações de crises provenientes de insuficiência de demanda efectiva. Keynes (1985), defendia a intervenção governamental na economia quando a mesma se encontrasse na condição de elevado nível de desemprego involuntário e de insuficiência crónica de demanda efectiva, como forma de retomar uma nova etapa de crescimento, reaquecendo uma economia estagnada ou em recessão, o que não poderia acontecer com o preconizado pela teoria neoclássica, através dos mecanismos auto reguladores do mercado ou empresas com capital próprio e fechadas à concorrência. A mão invisível que regula o mercado, como diz A. Smith em 1776, é pensada mais tarde pelos neoclássicos como o consumo feito pelo povo de bens fabricados sem custo nenhum: pela mão colonizada ou escrava de África, especialmente Moçambique e Angola.

Será, pois felonias dos nossos soberanos, ou uma não lembrança dos economistas portugueses de ser necessário industrializar Portugal para ser considerado um produtor autónomo, em quem se pode confiar porque sabe as leis da produção, tem uma legislação que protege os desvalidos, aceita sindicatos e greves, e uma colaboração solidária entre proprietários e trabalhadores. Pergunto-me eu se entre 1974 e hoje, os vários governos ter-se-iam lembrado que a pesca, a agricultura desenvolvida, pelos que sabem a teoria e não apenas produzir para comer, sem exportar bens agrícolas, bens que são quase inexistentes no resto dos países da União Europeia. Era uma excelente entrada de capital a venda de produtos rurais manufacturados. É evidente que com o aço da Suécia não se pode concorrer: por dominar o mercado, nenhum outro país ia entrar pelas vias da concorrência, especialmente se não tem metal nem minas para fabricar o que se vende, e bem, por um Estado habituado a saber cuidar da sua economia, usando as minas de aço para os seus fabricos diversificados. Ou com a França e o seu vinho. Essa ideia de converter o vinho na exportação principal, foi um fracasso rotundo por causa dos vinhos de França e da Alemanha, ou os fabricos de barcos da Grã-Bretanha ou as suas indústrias de aviões. As guerras criadas para venda de helicópteros, armas, aviões de longa duração para voos se abastecimento, são a melhor fonte de entrada dos países como os EUA, Grã-Bretanha e Alemanha.

Será, pois, uma felonia dos nossos representantes, ou o esquecimento de organizar cooperativas de produção de leite e de carne? Penso que os nossos empresários investem mais lá fora do que em organizar Portugal como uma potência de petróleo, que tem vinho do Porto, especiarias, fabricadas para serem consumidas dentro do nosso país. A felonia reside no facto de não se realizar uma devida reforma agrária, cooperativas de terra, vinho e carne, em vez de se andar a debater sobre a nossa vida privada.


A felonia é o desencontro permanente entre ideologias que apenas pensam em mercadorias para vender e serem compradas pelo nosso país. O orçamento de Estado de 2011 começou o seu declínio no dia em que entramos na, denominada nesses tempos, Comunidade Europeia. Se o nosso país está em falência, deve-se a essa confiança de sermos nós os consumidores de bens, para recuperar maus investimentos desde o dia em que a Democracia voltou ao nosso país. Se Portugal usar a sua deliberação para obrigar os investidores a trabalhar dentro do país e não a confiar em empresas estrangeiras que um dia qualquer fecham e vão embora.

E a lã das ovelhas, a carne de porco, o leite produzido em cooperativa, como a Galiza tem feito, passando assim a ser um país mono produtor mas sem concorrência, o debate sobre o nosso futuro seria outro, não apenas sobre o casamento, a adopção, o aborto, a catolicidade dos cidadãos, assuntos já resolvidos faz anos noutros países. Não, a felonia dos nossos soberanos é a falta de organização da produção e a sua especialização, como foi feito na Galiza nos últimos 20 anos. 


Os nossos governantes não andam em felonias, nenhum deles: o problema é não saberem as leis da economia e terem chegado tarde à corrida do mono produção, 20 anos mais tarde que o primeiro tratado de Roma, de 1958, ao criar a Comunidade de Nações. Nem Espanha nem Portugal foram ouvidos nem convidados: os seus governos não eram fiáveis e, é hoje, que pagamos a loiça rota por ter aceitado ditaduras contra as que ninguém se rebelara, excepto Portugal, mas sem inversões: era necessário, antes, criar um país….
  • O mais triste para mim, é que não se perspectiva nenhuma coligação de governantes para salvar o país da falência, existindo, pelo contrário, a mútua recriminação por…. Pecados cometidos por outros, anos atrás…O Palácio de São Bento não é o culpado…Chegaram tarde demais ao Tratado Constitutivo daComunidade Europeia da Energia Atómica (Euratom).
Foram assinados em 25 de Março  de 1957 em Roma  pela Alemanha, França, Itália, Bélgica, Países Baixos Luxemburgo. Entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1958A assinatura deste tratado é o culminar de um processo que surge após a Segunda Guerra Mundial, que deixou a Europa destruída económica e politicamente, e “submetida” às duas superpotências: Estados Unidos e União Soviética.

Nós ainda estamos debaixo da vida nua da Segunda Guerra Mundial…

Raul Iturra
Nov2010

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terça-feira, 12 de abril de 2011

A criança abandonada

aloneImage by zeynep'arkok via Flickr



António Campos


abandonada não apenas de comida, mas sim de carinho...

 Falar em crianças, é uma tarefa difícil. Pensamos que sabemos tudo sobre elas e tratamo-las como melhor nos parece, ou reparamos nada saber e mimamos um ser que toma vantagem da dor dos pais, que vivem arrependidos desse nada saber. Arrependimento reflectido nas suas caras e nos presentes oferecidos, na simpatia usada para matar a dor da falta de apreço do seu comportamento. Quando nada se sabe sobre criar filhos, a dor bate nos progenitores.

O desconhecimento de como tomar conta de uma criança é uma maneira de a abandonar. No lado oposto, há os que pensam tudo saber, mandando nela como se fosse escrava: punem, corrigem, batem, e enviam-na para a solidão do quarto. Em sociedades patriarcais, como a nossa, onde é o elemento masculino do grupo doméstico, quem dá menos carinho, arremete mais sobre os seus filhos e pede-lhes contas, de manhã à noite. Sem nada, devem inventar, como tenho observado no meu trabalho de campo em várias aldeias e diferentes continentes. Especialmente se o dia se passou sem se fazer nada de produtivo aos olhos dos pais, ou se a produtividade desejada, vira jogo de berlindes, da macaca ou na exploração do mato com os seus camaradas.

Tenho narrado noutros textos, a existência de uma diferença entre menino e menina. Esta segunda pessoa tem o seu tempo todo ocupado. As sociedades patriarcais usam e abusam das senhoras desde novas: nos trabalhos na cozinha, no coser e remendar das roupas e na permanência junto da mãe para saberem como é que a vida deve recorrer dentro do lar, estudem ou não.

Bem sabemos que o estudo é obrigatório e obter uma boa avaliação, a recompensa aos esforços que um dia podem levar à Universidade e às profissões doutorais. Mas, isto acontece a uma pequena fatia do nosso país, especialmente em tempos de crise como a que vivemos actualmente. Os rapazes são enviados a trabalhar em qualquer actividade que dê lucro, moedas que devem ficar sempre em casa para um fundo familiar que pode ajudar quando o dinheiro é escasso. A criança é abandonada às suas habilidades para lucrar e prestar contas ao patrão da obra e ao patrão da casa, que guarda o dinheiro.

Uma terceira forma de abandono que tenho observado, é o descarinho que desencaminha da afectividade e cuidados de pequenos afectos as crianças. Quando a criança é bebé, é o amor dos amores dos progenitores que observam como cresce e as gracinhas que faz. Hoje em dia, é raro ver esse carinho, porque pais e mães trabalham e os mais novos ou ficam com alguém da família, una avó normalmente, ou vão para o infantário e, hoje em dia também, ao pré infantário, tanta é a necessidade dos raros euros que os nossos bolsos podem suportar, transitar ou guardar.

Uma quarta forma de abandono, é esse não saber o abecedário do corpo da sua fisiologia e de como num curto espaço de tempo deve mudar. Entre rapazes, as mudanças fisiológicas é aprendida dos mais atrevidos do grupo, que começam nos denominados sonhos molhados, e continua por uma masturbação colectiva, até encontrar, já púbere, a pessoa dos seus desejos com quem faz amor. Nos dias de hoje, todo o namoro, começa logo numa relação sexual íntima, que pode ou não continuar ao longo do tempo.

Mas o maior dos abandonos, é não tratar as crianças de forma carinhosa, com mimos e carícias, divertimentos e jogos entre todos os parentes que moram debaixo do mesmo tecto, não se fomenta a leitura conjunta nem se comentam os livros durante as refeições.

Finalmente, a criança mais abandonada, é a que é colocada em internatos, casas de amas, colégios de sacerdotes, apesar do que hoje todos sabemos e os pais querem ignorar pela vergonha que este facto causa e que deve ficar apenas dentro da família.

Uma criança abandonada, é a pior das felonias que um adulto pode cometer. Especialmente se a criança é abandonada em locais em que é abusada. Nestes últimos anos é que começamos a saber como adultos consagrados usam os seus estudantes, púberes ou não, para satisfazer a sua sexualidade.

E mais nada digo, a criança abandonada acaba por ser um adulto sem carinho: não teve de onde aprender!

Raul Iturra
Nov.2010

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sexta-feira, 8 de abril de 2011

A grande ofensiva do capitalismo financeiro global 3

LONDON, ENGLAND - JANUARY 21:  A protester wea...Image by Getty Images via @daylife



António Campos


Na esfera política, assiste-se à emergência progressiva de elementos neoliberais nos partidos socialistas europeus, sustentados nas teorias de Giddens (o ideólogo da “terceira via”), dos quais Tony Blair será o mais marcante. Entre a fidelidade aos princípios e o acesso fácil ao poder escolhem o segundo. A partir daí, deixa de haver diferenças significativas entre estes e os partidos de centro-direita em questões económicas, pelo que, nas eleições, já não se jogam alternativas, sobrando a alternância. Por sua vez, o poder político (tanto a nível nacional como europeu) é “canibalizado” pelo poder económico e financeiro. A promiscuidade entre ambos é cada vez mais frequente: começa a não espantar a facilidade como ex-governantes acabam em gestores de grandes empresas e vice-versa. Consequentemente, a corrupção alastra.

A democracia vai sendo, progressivamente, esvaziada de conteúdo e os políticos do “centrão”, reféns do capital, não têm resposta para os problemas das populações e vão caindo no descrédito. É um terreno fértil para a demagogia populista, que atiça os piores sentimentos dos desfavorecidos contra os diferentes (como outras etnias e/ou religiões, os homossexuais) ou os ainda mais desfavorecidos (imigrantes e ciganos, por exemplo). A exploração dos medos (em especial, a sobrevalorização das ameaças terroristas) é outra forma de aceitar a supressão de direitos em nome de uma suposta segurança.

Face à gravidade da situação, é urgente darmos uma resposta a esta ofensiva. Porém, como estamos em presença de uma realidade nova, as respostas clássicas não servem. Temos de inventar novas formas de luta. Como princípio, destaco dois aspectos que me parecem fundamentais: a transnacionalização do combate e a saída para fora da classe docente. Um novo movimento cívico, capaz de incluir pessoas nas situações mais diversas (incluindo trabalhadores precários e desempregados), pode ser o início de um novo caminho, embora saibamos que não será fácil de trilhar.

 Entretanto, aproveito para lançar uma ideia: o capital procura aproveitar as contradições no seio dos trabalhadores para criar divisões (por ex., entre trabalhadores do sector público e do sector privado). Não seria de utilizarmos as contradições no seio do capital (por ex., entre capital produtivo e capital financeiro) para o mesmo fim?

Final desta série.

Jorge Martins
Nov.2010

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terça-feira, 5 de abril de 2011

Conhece-te a ti mesma(o)

“How shall we learn to know ourselves? By refl...Image by katerha via Flickr



António Campos


É um programa de longo alcance, muitas vezes negligenciado por cada uma de nós em benefício do conhecimento dos outros. No entanto, não podemos ajuizar o que nos rodeia se cada uma de nós não dispuser de bases sólidas para o fazer. Bases que nos permitem viver com os nossos semelhantes, aqueles que estão imbuídos da mesma exigência.

Por preguiça intelectual ou física – ou vice-versa – a grande maioria dos seres humanos resigna-se docilmente a adoptar as ideias e as condições de existência que os pais, os mestres e aqueles que o rodeiam lhes impõem. Esta demissão na adaptação ao meio permite avaliar os nossos próprios actos. Mas, geralmente, não é apercebida pelo indivíduo. Claro que o indivíduo que se conhece bem, não acha que pensa livremente. A sua personalidade podia ser de outra maneira? Afinal, a grande maioria das pessoas estão convencidas que se encontram em perfeita sintonia com a sociedade à qual pertencem.

Na realidade, não nos damos conta que somos prisioneiras(os) não somente dos nossos hábitos, bons ou maus, úteis ou nefastos, como igualmente da moda, das sensações impostas, de conceitos e de abstracções que negam a possibilidade do indivíduo viver por ela(e) própria(o) a sua própria vida.

O ser humano quando nasce é inocente. Tem de aprender tudo. É a mãe que, no berço, se encarrega do seu filho como se ele fosse um objecto. É ainda segundo o seu parecer, ou o dos seus pais, ou das crenças que a abrasam, que a criança será baptizada ou objecto de circuncisão. É debaixo da sua autoridade que ele irá ficar a chorar sob o pretexto que a hora de mamar ainda não chegou ou, então, será forçado a beber demasiado quente ou com açúcar a mais. É então que os hábitos começam. Vão insinuando-se de modo progressivo e só podem desaparecer lentamente se nós os julgarmos desnecessários ou perigosos. Estão inscritos na memória e nos reflexos provocados pelos hábitos e as crenças. Daí a necessidade de visionarmos as nossas mais pequenas acções, a partir do momento em que começamos a compreender as situações novas com as quais nos deparamos. Uma moda acaba de aparecer na televisão, um novo vocabulário surge como mais um progresso técnico. Não fomos nós que inventámos esse novo gesto e esse novo vocabulário. Que cada um de nós fique alerta!

Conhecer-se a si mesma(o) é ter a possibilidade real de controlar os nossos hábitos e, se for caso disso, de sermos nós mesmas(os) a mudá-los. Tem pouco interesse inquietarmos-nos com aquilo que não sabemos – abstracção ou sonho ilusório – mas, já tem todo interesse inquietarmos-nos com aquilo que pensamos saber e com aquilo que temos como adquirido. Esta permanente introspecção é indispensável a todo o ser que reflecte. Entre os nossos comportamentos escolhemos os mais simples, aqueles que dizem respeito às nossas necessidades mais elementares: actividade física e manual, sono, alimentação, higiene corporal, afectividade que vai do amor à solidariedade, mas também a linguagem que empregamos. Questionemos esses assuntos e se verificarmos que as nossas actividades e o nosso comportamento têm normas que conhecemos mas não colocamos em prática, modifique-se de imediato o que achamos que deve ser modificado.

É inútil procurar fora de nós aquilo que podemos encontrar dentro de nós. Quando nos seguimos a nós próprias(os), possuímos o bem mais inestimável que existe, a liberdade de sermos proprietárias(os) de nós mesmas(os).

Recebemos em património uma consciência, sentidos, razão. Utilizemos essas verdadeiras riquezas. Que o nosso hábito seja a disciplina do nosso próprio eu. A via do conhece-te a ti mesma(o). Temos de recusar abandonarmo-nos às mentiras, às bajulações e às honras daqueles que não se enxergam.

Olinda Celeste
(adaptado com a devida vénia)
 Nov.2010

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sexta-feira, 1 de abril de 2011

A grande ofensiva do capitalismo financeiro global 2

DSC01971Image via Wikipedia



António Campos


Entretanto, tudo isto é acompanhado de uma forte doutrinação ideológica: procura mostrar a globalização económica e financeira como uma inevitabilidade decorrente da globalização tecnológica; equipara as economias nacionais às domésticas, alertando contra os défices orçamentais (que seriam resultado dos elevados custos dos benefícios sociais); procura desacreditar os serviços públicos e a função pública (descrita como parasitária e privilegiada), ao mesmo tempo que exalta a gestão empresarial privada. Por seu turno, na esfera dos valores, glorifica o individualismo e, pior que tudo, desacredita o idealismo, promovendo o pragmatismo sem princípios, o oportunismo sem escrúpulos e o mais despudorado cinismo. Também aqui a inevitabilidade surge como “pedra de toque”, expressa na recuperação da ideia de que existe uma “natureza humana” imutável e perversa. No fundo, o que é importante é ser bem sucedido, seja lá como for. Ao mesmo tempo, o espaço público vai sendo ocupado por economistas da escola neoliberal, que são apresentados como técnicos de uma ciência positiva. Querem criar a ideia da economia como uma ciência exacta, independente das ideologias e escolhas políticas, e dos economistas como simples tecnocratas, que se limitam a interpretar os dados económicos e a fazer previsões a partir daí. Entretanto, ao nível da gestão, a eficiência e a eficácia são apresentadas como valores absolutos em detrimento da democracia e da participação dos trabalhadores e das suas organizações, vistas como inimigas das primeiras.

Por outro lado, para conter o descontentamento dos trabalhadores pela contenção salarial e pela perda de regalias, promove-se o consumismo desenfreado (com recurso a crédito barato).

Simultaneamente, globaliza-se o “circo”, cobrindo exaustivamente grandes acontecimentos globais (sejam Jogos Olímpicos, Mundiais de futebol, concertos de música “pop”) ou, mesmo, explorando globalmente tragédias (como o funeral da princesa Diana ou a saga dos mineiros chilenos). Generalizam-se as telenovelas “de cordel”, pululam as revistas de mexericos e, com elas, as “celebridades” da treta, numa espécie de “star sistem” rasca. Surgem programas de entretenimento que estimulam o “voyeurismo” e promovem a estupidificação das massas. A juventude é particularmente visada: não é por acaso que se incentivam as praxes, as “queimas da fitas”, os festivais de música ou os jogos de vídeo.

Jorge Martins
Nov.2010

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